quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Para compreender a importância da taxa de câmbio na economia

O debate sobre os efeitos da valorização cambial na economia brasileira continua intenso. Como nos anos 90, alguns podem afirmar que o momento de apreciação cambial seria favorável à aquisição de máquinas e equipamentos baratos no exterior, estimulando o investimento agregado, ou ainda, o de que o câmbio apreciado facilitaria a aquisição de tecnologias que não possuímos do exterior.

Ocorre que ambos os argumentos parecem não descrever bem o que se observou durante a intensa apreciação cambial brasileira ao longo dos anos 90: baixíssimo nível de investimento agregado e baixo dinamismo tecnológico na indústria brasileira nos setores de ponta.

O efeito mais forte da apreciação cambial nas cadeias produtivas de bens comercializáveis, tanto agrícolas quanto de bens industriais, se faz sentir principalmente nas margens de lucro.

A apreciação cambial representa uma queda imediata e intensa de preços de venda e margens de lucro em toda a cadeia que trabalha com preços internacionais, especialmente nos setores que não tem poder de mercado.

A redução de preços de máquinas e equipamentos importados decorrente da apreciação cambial está longe de compensar a redução nos lucros que, baixos, não estimulam o investimento.

Os aumentos de importação de bens de capital observados na balança comercial são primordialmente direcionados para a substituição da produção de máquinas e equipamentos domésticos, o que por si só pode reduzir nossa capacidade de inovação e melhora tecnológica em setores de ponta. O aumento da importação de máquinas não significa necessariamente um aumento do investimento agregado.

Sobrevalorizações cambiais são especialmente nocivas para processos de desenvolvimento econômico, pois reduzem substancialmente a lucratividade da produção e investimento nos setores de bens comercializáveis manufatureiros. Além do que, podem impedir a transferência de mão-de-obra dos setores de baixa produtividade para os de alta produtividade, já que o preço dos bens não-comercializáveis fica artificialmente elevado.

Ao realocar recursos para os setores não-manufatureiros, especialmente para a produção de commodities (com retornos decrescentes de escala), e para setores não-comercializáveis, as sobrevalorizações cambiais acabam por afetar toda a dinâmica tecnológica da economia.

Subvalorizações, por outro lado, estimulam e o investimento nos setores manufatureiros onde retornos crescentes de escala são possíveis.

O nível de taxa de câmbio é, portanto, uma variável fundamental no processo de desenvolvimento econômico. Ao definir a rentabilidade da produção de manufaturas através da relação preços comercializáveis/não-comercializáveis, o câmbio real acaba por definir a viabilidade de setores econômicos importantes para o aumento da produtividade geral da economia. Portanto, uma moeda competitiva pode ser o estímulo adequado para a integração de trabalhadores(as) em atividades de alta produtividade e retornos crescentes.

Entretanto, no Brasil uma possível restrição macroeconômica ao crescimento é o modus operandi da política monetária. O Banco Central brasileiro tem uma excessiva preocupação com a taxa de inflação, aumentando a taxa básica de juros em função de pressões inflacionárias advindas de variações na taxa nominal de câmbio. Essa dinâmica de determinação da taxa de juros impõe uma ineficácia relativa da política monetária, sendo uma das causas da elevada taxa de juros prevalecente na economia brasileira.

Neste contexto, verifica-se a existência de uma armadilha juros-câmbio na economia brasileira. Com efeito, a eliminação do desalinhamento cambial imporia, na atual estrutura de condução da política monetária, uma forte elevação da taxa de juros, o que teria impacto nocivo sobre o investimento e, portanto, sobre a sustentabilidade do crescimento econômico no longo prazo.

Para tanto, o próximo governo brasileiro caso queira promover um crescimento sustentado e de longo prazo, no mínimo terá que discutir medidas de política econômica como, metas implícitas de câmbio, controles sobre a saída de capitais de curto prazo e flexibilização do regime de metas de inflação.

(aspas)

 

Por : Paulo Daniel, para a Revista “Carta Capital”, 06/08/2010

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