quinta-feira, 30 de junho de 2011

REVOGAÇÃO DA IN 206/2002

Amigos,

A IN 206/02 foi revogada hoje pela IN 1.169/11.

Estou analisando o teor da nova IN para tecer comentários em breve.

Att.

ROGERIO ZARATTINI CHEBABI

Portaria RFB nº 3.014/11-Atividades Fiscais/Planejamento Receita Federal

Portaria RFB nº 3.014/11-Atividades Fiscais/Planejamento Receita Federal
30/06/2011 - 10:44


IOB 30.06.11


Portaria RFB nº 3.014, de 29.06.2011 - DOU 1 de 30.06.2011


Dispõe sobre o planejamento das atividades fiscais e estabelece normas para a execução de procedimentos fiscais relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.



O Secretário da Receita Federal do Brasil, no uso das atribuições que lhe conferem o art. 45 do Anexo I ao Decreto nº 7.482, de 16 de maio de 2011, e o inciso III do art. 273 do Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal do Brasil, aprovado pela Portaria MF nº 587, de 21 de dezembro de 2010, e tendo em vista o disposto no art. 2º do Decreto nº 3.724, de 10 de janeiro de 2001,



Resolve:



Art. 1º O planejamento das atividades de fiscalização dos tributos federais e do comércio exterior, consistente na descrição e quantificação das atividades fiscais em cada ano-calendário, será elaborado pela Subsecretaria de Fiscalização (Sufis) e pela Subsecretaria de Aduana e Relações Internacionais (Suari), no âmbito de suas respectivas áreas de competência, considerando:



I - as diretrizes estabelecidas pelos respectivos Subsecretários; e



II - as propostas das unidades descentralizadas.



§ 1º O planejamento dos procedimentos fiscais de que trata o caput deverá observar os princípios do interesse público, da impessoalidade, da imparcialidade, da finalidade e da razoabilidade.



§ 2º As diretrizes referidas no inciso I do caput privilegiarão as ações voltadas à prevenção e ao combate à evasão tributária e à correta aplicação das normas de comércio exterior, e serão estabelecidas em função de estudos econômico-fiscais e das informações disponíveis para fins de seleção e preparo da ação fiscal, inclusive as constantes dos relatórios decorrentes dos trabalhos desenvolvidos pelas atividades de pesquisa e investigação.



§ 3º Observada a finalidade institucional da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), a realização de procedimentos fiscais em cada ano-calendário, para atendimento de demandas de órgãos externos com caráter requisitório, não poderá comprometer mais de vinte por cento da força de trabalho alocada em atividade de fiscalização, determinada com base na relação homem/hora.



§ 4º Em situações especiais, o Coordenador-Geral de Fiscalização e o Coordenador-Geral de Administração Aduaneira poderão, em caráter prioritário, determinar a realização de atividades fiscais, ainda que não constantes do planejamento de que trata o caput.



CAPÍTULO I

DOS PROCEDIMENTOS FISCAIS



Art. 2º Os procedimentos fiscais no âmbito da RFB serão instaurados com base em Mandado de Procedimento Fiscal (MPF) e deverão ser executados por Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, observada a emissão de:



I - Mandado de Procedimento Fiscal de Fiscalização (MPFF), para instauração de procedimento de fiscalização; e



II - Mandado de Procedimento Fiscal de Diligência (MPFD), para realização de diligência.



Art. 3º Para fins desta Portaria, entende-se por procedimento fiscal:



I - de fiscalização, as ações que objetivam a verificação do cumprimento das obrigações tributárias, por parte do sujeito passivo, relativas aos tributos administrados pela RFB, bem como da correta aplicação da legislação do comércio exterior, podendo resultar em lançamento de ofício com ou sem exigência de crédito tributário, apreensão de mercadorias, representações fiscais, aplicação de sanções administrativas ou exigências de direitos comerciais; e



II - de diligência, as ações destinadas a coletar informações ou outros elementos de interesse da administração tributária, inclusive para atender exigência de instrução processual.



Parágrafo único. O procedimento fiscal poderá implicar a lavratura de auto de infração, a notificação de lançamento ou a apreensão de documentos, materiais, livros e assemelhados, inclusive por meio digital.



CAPÍTULO II

DO MANDADO DE PROCEDIMENTO FISCAL



Art. 4º O MPF será emitido exclusivamente na forma eletrônica e assinado pela autoridade emitente, mediante a utilização de certificado digital válido, conforme modelos constantes dos Anexos de I a III desta Portaria.



Parágrafo único. A ciência do MPF pelo sujeito passivo dar-se-á no sítio da RFB na Internet, no endereço , com a utilização de código de acesso consignado no termo que formalizar o início do procedimento fiscal.



Art. 5º Nos casos de flagrante constatação de contrabando, descaminho ou de qualquer outra prática de infração à legislação tributária ou de comércio exterior, em que o retardo do início do procedimento fiscal coloque em risco os interesses da Fazenda Nacional, pela possibilidade de subtração de prova, o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil deverá iniciar imediatamente o procedimento fiscal.



§ 1º Para fins do disposto no caput, o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil deverá lavrar termo circunstanciado, mencionando tratar-se de procedimento fiscal especial amparado por este artigo, contendo, no mínimo, as seguintes informações:



I - dados identificadores do sujeito passivo;



II - natureza do procedimento fiscal e descrição dos fatos, bem como o rol dos livros, documentos ou mercadorias objeto de retenção ou apreensão, se houver;



III - nome e matrícula do Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável pelo procedimento fiscal; e



IV - nome, número do telefone e endereço funcional do responsável pela equipe a que está vinculado o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil referido no inciso III.



§ 2º Do termo referido no § 1º será dada ciência ao sujeito passivo, sendo-lhe fornecida cópia.



§ 3º Na hipótese prevista no caput, o Mandado de Procedimento Fiscal de Fiscalização - Especial (MPF-E) correspondente será emitido no prazo de cinco dias contados da data do início do procedimento fiscal.



§ 4º A ciência do MPF-E pelo sujeito passivo dar-se-á nos termos do disposto do parágrafo único do art. 4º, com a utilização de código de acesso consignado no primeiro termo lavrado após a sua emissão.



Art. 6º O MPF será emitido, observadas as respectivas atribuições regimentais, pelas seguintes autoridades:



I - Coordenador-Geral de Fiscalização;



II - Coordenador-Geral de Administração Aduaneira;



III - Superintendente da Receita Federal do Brasil;



IV - Delegado da Receita Federal do Brasil;



V - Inspetor-Chefe da Receita Federal do Brasil;



VI - Corregedor-Geral;



VII - Coordenador-Geral de Pesquisa e Investigação; ou



VIII - Coordenador-Geral de Programação e Estudos.



§ 1º As autoridades indicadas nos incisos IV e V somente poderão emitir MPF no âmbito de suas respectivas áreas de competência.



§ 2º As autoridades indicadas nos incisos VI, VII e VIII e o Delegado da Receita Federal do Brasil de Administração Tributária somente poderão emitir MPF-D.



§ 3º Somente será admitida delegação de competência para emissão e alteração de MPF nas seguintes hipóteses:



I - de Superintendente da Receita Federal do Brasil para Chefe de Divisão de Fiscalização, de Administração Aduaneira ou de Repressão ao Contrabando e Descaminho, da Superintendência;



II - do Coordenador-Geral de Pesquisa e Investigação para Chefe de Escritório e Núcleo de Pesquisa e Investigação;



III - do Corregedor-Geral para Chefe de Escritório e Núcleo da Corregedoria;



IV - do Delegado da Receita Federal do Brasil de Delegacias Especiais e de Delegacias Classe "A" ou "B", para Chefe de Divisão/Serviço de Fiscalização da Delegacia;



V - do Delegado da Delegacia Especial da Receita Federal do Brasil de Administração Tributária para Chefe da Divisão de Orientação e Análise Tributária da Delegacia; e



VI - do Inspetor-Chefe de Alfândegas e Inspetorias da Receita Federal do Brasil para Chefe do Serviço de Fiscalização Aduaneira.



§ 4º Os procedimentos de fiscalização a serem realizados na jurisdição de outra unidade descentralizada, subordinada à mesma região fiscal, serão autorizados pelo respectivo Superintendente.



§ 5º A realização de procedimento de fiscalização em uma região fiscal, por Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil em exercício em unidades de região fiscal diversa, será autorizada por Ordem de Serviço ou documento equivalente do Coordenador-Geral de Fiscalização ou do Coordenador-Geral de Administração Aduaneira, precedida de manifestação da Superintendência que jurisdiciona o contribuinte.



§ 6º Após a expedição da Ordem de Serviço ou ato equivalente referido no § 5º, a unidade de jurisdição do contribuinte emitirá o MPF.



§ 7º A realização de procedimentos de fiscalização por unidades que possuem jurisdição concorrente será regulamentada, no âmbito de suas respectivas áreas de competência, por ato do Subsecretário de Fiscalização e do Subsecretário de Aduana e Relações Internacionais.



§ 8º A autorização para reexame em relação ao mesmo exercício poderá ser efetuada pelas autoridades competentes diretamente no MPF-F.



§ 9º Na impossibilidade de as autoridades de que tratam os incisos IV e V do caput efetuarem a emissão ou alteração de MPF, o Superintendente da respectiva região fiscal poderá fazê-lo.



Art. 7º O MPF-F, o MPF-D e o MPF-E conterão:



I - a numeração de identificação e controle;



II - os dados identificadores do sujeito passivo;



III - a natureza do procedimento fiscal a ser executado (fiscalização ou diligência);



IV - o prazo para a realização do procedimento fiscal;



V - o nome e a matrícula do Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável pela execução do mandado;



VI - o nome, o número do telefone e o endereço funcional do responsável pela equipe a que está vinculado o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil referido no inciso V; e



VII - o nome, a matrícula e o registro de assinatura eletrônica da autoridade emitente e, na hipótese de delegação de competência, a indicação do respectivo ato.



§ 1º O MPF-F e o MPF-E indicarão, ainda, o tributo objeto do procedimento fiscal a ser executado, podendo ser fixado o respectivo período de apuração, bem como as verificações relativas à correspondência entre os valores declarados e os apurados na escrituração contábil e fiscal do sujeito passivo, em relação aos tributos administrados pela RFB, podendo estas alcançar os fatos geradores relativos aos últimos cinco anos e os do período de execução do procedimento fiscal, observados os modelos constantes dos respectivos Anexos I e II a esta Portaria.



§ 2º O Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil poderá examinar livros e documentos referentes a períodos não consignados no MPF-F, quando necessário para verificar os fatos que deram origem a valor computado na escrituração contábil e fiscal do período em exame, ou deles seja decorrente.



§ 3º O MPF-D indicará, ainda, a descrição sumária das verificações a serem realizadas, observado o modelo constante do Anexo III a esta Portaria.



§ 4º O MPF-E indicará a data do início do procedimento fiscal, observado o modelo constante do Anexo II a esta Portaria.



§ 5º Na hipótese de instauração de procedimento fiscal destinado exclusivamente a verificar o cumprimento de obrigação acessória, o MPF-F deverá identificar a obrigação e o período a que se refere, conforme modelo constante do Anexo I a esta Portaria, não se aplicando o disposto no § 1º.



§ 6º O disposto no § 1º não se aplica no caso de procedimento fiscal destinado a constatar a correta aplicação da legislação de comércio exterior que possa resultar tão somente em apreensão de bens ou mercadorias, representações fiscais, aplicação de sanções administrativas ou exigência de multas ou direitos comerciais, hipótese em que o MPF-F poderá indicar apenas a descrição sumária das verificações a serem efetuadas.



Art. 8º Na hipótese em que infrações apuradas, em relação a tributo contido no MPF-F ou no MPF-E, também configurarem, com base nos mesmos elementos de prova, infrações a normas de outros tributos, estes serão considerados incluídos no procedimento de fiscalização, independentemente de menção expressa no MPF.



Art. 9º As alterações no MPF, decorrentes de prorrogação de prazo, inclusão, exclusão ou substituição de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável pela execução ou supervisão, bem como as alterações relativas a tributos a serem examinados e a período de apuração, serão procedidas mediante registro eletrônico efetuado pela respectiva autoridade emitente, conforme modelo constante do respectivo Anexo a esta Portaria, cientificado o contribuinte nos termos do parágrafo único do art. 4º.



Art. 10. O MPF não será exigido nas hipóteses de procedimento de fiscalização:



I - realizado no curso do despacho aduaneiro;



II - interno, nos casos de formalização de exigência de crédito tributário constituído em termo de responsabilidade ou pelo descumprimento de regime aduaneiro especial, lançamento de multas isoladas, revisão aduaneira e formalização de abandono ou apreensão de mercadorias realizada por outros órgãos;



III - de vigilância e repressão ao contrabando e descaminho realizado em operação ostensiva;



IV - relativo à revisão interna de declaração, inclusive na hipótese de aplicação de penalidade por falta ou atraso em sua apresentação (malhas fiscais);



V - destinado, exclusivamente, à aplicação de multa por não atendimento à intimação efetuada por Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil em procedimento de diligência realizado mediante a utilização de MPF-D;



VI - destinado à aplicação de multa por não atendimento à Requisição de Informações sobre Movimentação Financeira (RMF), nos termos do art. 4º do Decreto nº 3.724, de 10 de janeiro de 2001; e



VII - destinado à verificação de ocorrência de avaria ou extravio de mercadorias sob controle aduaneiro.



§ 1º Na hipótese de realização de diligência, em decorrência dos procedimentos fiscais de que trata este artigo, deverá ser emitido MPF-D.



§ 2º Em relação ao disposto no inciso II do caput, é dispensado o MPF para os procedimentos de revisão aduaneira que puderem ser realizados com base unicamente nos elementos probatórios disponíveis no âmbito da RFB.



CAPÍTULO III

DOS PRAZOS



Art. 11. Os MPF terão os seguintes prazos máximos de validade:



I - 120 dias, nos casos de MPF-F e de MPF-E; e



II - sessenta dias, no caso de MPF-D.



Art. 12. A prorrogação do prazo de que trata o art. 11 poderá ser efetuada pela autoridade emitente, tantas vezes quantas necessárias, observado, em cada ato, os prazos fixados nos incisos I e II do art. 11, conforme o caso.



Art. 13. Os prazos a que se referem os arts. 11 e 12 serão contínuos, excluindo-se na sua contagem o dia do início e incluindo-se o do vencimento, nos termos do art. 5º do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972.



Parágrafo único. A contagem do prazo do MPF-E far-se-á a partir da data do início do procedimento fiscal.



CAPÍTULO IV

DA EXTINÇÃO DO MANDADO DE PROCEDIMENTO FISCAL



Art. 14. O MPF se extingue:



I - pela conclusão do procedimento fiscal, registrado em termo próprio, com a ciência do sujeito passivo; ou



II - pelo decurso dos prazos a que se referem os arts. 11 e 12.



Parágrafo único. A ciência do sujeito passivo de que trata o inciso I do caput deverá ocorrer no prazo de validade do MPF.



Art. 15. A hipótese de que trata o inciso II do art. 14 não implica nulidade dos atos praticados, podendo a autoridade responsável pela expedição do Mandado extinto determinar a emissão de novo MPF para a conclusão do procedimento fiscal.



CAPÍTULO V

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS



Art. 16. Cabe aos administradores da RFB assegurar o pleno e inviolável exercício das atribuições do Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável pela execução do procedimento fiscal.



Art. 17. Outros Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, ainda que não constem do MPF, poderão participar do procedimento fiscal e firmar termos, intimações ou atos assemelhados, desde que em conjunto com o responsável por sua execução.



Art. 18. Os MPF emitidos e suas alterações permanecerão disponíveis para consulta na Internet, mediante a utilização do código de acesso de que trata o parágrafo único do art. 4º inclusive após a conclusão do procedimento fiscal correspondente.



CAPÍTULO VI

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS



Art. 19. Ficam aprovados os seguintes modelos de Mandado de Procedimento Fiscal:



I - Anexo I: Mandado de Procedimento Fiscal de Fiscalização (MPF-F);



II - Anexo II: Mandado de Procedimento Fiscal de Fiscalização - Especial (MPF-E); e



III - Anexo III: Mandado de Procedimento Fiscal de Diligência (MPF-D).



Art. 20. Esta Portaria entra em vigor em 1º de agosto de 2011.



Art. 21. Fica revogada a Portaria RFB nº 11.371, de 12 de dezembro de 2007.



CARLOS ALBERTO FREITAS BARRETO

Governo autoriza seis empresas a fabricarem tablets com redução de impostos

29.6.2011 - (Agência Brasil)

 O governo federal aprovou o pedido de redução de impostos para seis empresas fabricarem tablets no Brasil. As empresas MXT, Positivo, Samsung, Motorola, Envision e Aiox terão redução de PIS/Cofins e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

As empresas foram as primeiras a conseguir os benefícios do Processo Produtivo Básico (PPB) específico para o setor eletroeletrônico e da medida provisória que incluiu os computadores portáteis do tipo prancheta (tablets) na mesma categoria dos computadores convencionais e notebooks.

Com a redução dos impostos federais (IPI e PIS/Cofins), somada à queda do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é um tributo estadual, deve haver uma redução de até 40% nos preços dos equipamentos, segundo previsão do secretário de Políticas de Informática do Ministério de Ciência e Tecnologia, Virgilio Almeida.

O objetivo das normas é garantir que o Brasil tenha conhecimento das tecnologias empregadas na fabricação do equipamento e que possa desenvolver novos equipamentos de acordo com o avanço das pesquisas. Segundo o ministério, desde o anúncio da redução de impostos para os produtos, em maio deste ano, 15 empresas mostraram interesse na produção de tablets.

Os pedidos de isenção fiscal são analisados pela Secretaria de Política de Informática do Ministério da Ciência e Tecnologia, pela Secretaria de Desenvolvimento Produtivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e pelo Ministério da Fazenda. Até o fim do ano, a maioria das empresas interessadas na isenção fiscal já deve estar produzindo os tablets no país.

Fonte: Agência Brasil - notícia de 28.6.2011

Leia em: http://www.comexdata.com.br/index.php?PID=3001291#ixzz1QlDnvUfl
Instrução Normativa RFB nº 1.169, de 29.06.2011 - DOU 1 de 30.06.2011


Estabelece procedimentos especiais de controle, na importação ou na exportação de bens e mercadorias, diante de suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento.

O Secretário da Receita Federal do Brasil, no uso da atribuição que lhe confere o inciso III do art. 273 do Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal do Brasil, aprovado pela Portaria MF nº 587, de 21 de dezembro de 2010 e tendo em vista o disposto nos arts. 34 e 793 a 795 do Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009, no art. 36 da Lei nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993 e no art. 68 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001,

Resolve:

 Art. 1º O procedimento especial de controle aduaneiro estabelecido nesta Instrução Normativa aplica-se a toda operação de importação ou de exportação de bens ou de mercadorias sobre a qual recaia suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento, independentemente de ter sido iniciado o despacho aduaneiro ou de que o mesmo tenha sido concluído.

 CAPÍTULO I

DOS INDÍCIOS DE IRREGULARIDADE

Art. 2º As situações de irregularidade mencionadas no art. 1º compreendem, entre outras hipóteses, os casos de suspeita quanto à:

 I - autenticidade, decorrente de falsidade material ou ideológica, de qualquer documento comprobatório apresentado, tanto na importação quanto na exportação, inclusive quanto à origem da mercadoria, ao preço pago ou a pagar, recebido ou a receber;

II - falsidade ou adulteração de característica essencial da mercadoria;

III - importação proibida, atentatória à moral, aos bons costumes e à saúde ou ordem públicas;

IV - ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiro;

V - existência de fato do estabelecimento importador, exportador ou de qualquer pessoa envolvida na transação comercial; ou

VI - falsa declaração de conteúdo, inclusive nos documentos de transporte.

§ 1º As dúvidas da fiscalização aduaneira quanto ao preço da operação devem estar baseadas em elementos objetivos e, entre outras hipóteses, na diferença significativa entre o preço declarado e os:

I - valores relativos a operações com condições comerciais semelhantes e usualmente praticados em importações ou exportações de mercadorias idênticas ou similares;

II - valores relativos a operações com origem e condições comerciais semelhantes e indicados em cotações de preços internacionais, publicações especializadas, faturas comerciais pro forma, ofertas de venda, dentre outros;

III - custos de produção da mercadoria;

IV - valores de revenda no mercado interno, deduzidos os impostos e contribuições, as despesas administrativas e a margem de lucro usual para o ramo ou setor da atividade econômica.

§ 2º Os casos referidos à origem das mercadorias se aplicam também à origem não preferencial, nas hipóteses de suspeita de triangulação de mercadoria (circumvention) para subtrair-se à imposição de direitos comerciais (anti-dumping, salvaguardas e medidas compensatórias).

§ 3º Na caracterização das hipóteses dos incisos IV e V do caput, a autoridade fiscal aduaneira poderá considerar, entre outros, os seguintes fatos:

I - importação ou exportação de mercadorias em volumes ou valores incompatíveis com as instalações físicas, a capacidade operacional, o patrimônio, os rendimentos, ou com a capacidade econômico-financeira do importador, adquirente ou exportador, conforme o caso;

II - ausência de histórico de operações do sujeito passivo na unidade de despacho;

III - opção questionável por determinada unidade de despacho, em detrimento de outras que, teoricamente, apresentariam maiores vantagens ao interveniente, tendo em vista a localização do seu domicílio fiscal, o trajeto e o meio de transporte utilizados ou a logística da operação;

IV - existência de endosso no conhecimento de carga, ressalvada a hipótese de endosso bancário;

V - conhecimento de carga consignado ao portador;

VI - ausência de fatura comercial ou sua apresentação sem a devida assinatura, identificação do signatário e endereço completo do vendedor;

VII - aquisição de mercadoria de fornecedor não fabricante:

a) sediado em país considerado paraíso fiscal ou zona franca internacional;

b) cujo endereço exclusivo seja do tipo caixa postal; ou

 c) que apresente qualquer evidência de tratar-se de empresa de fachada.

Art. 3º A seleção das operações a serem submetidas ao procedimento especial previsto nesta Instrução Normativa poderá decorrer de decisão:

I - do chefe da unidade da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) com jurisdição sobre o local onde se encontrar a mercadoria sob suspeita, ou de qualquer servidor por ele designado; e

II - da Coordenação-Geral de Administração Aduaneira (Coana), mediante direcionamento para o canal cinza de conferência aduaneira.


CAPÍTULO II

DO PROCEDIMENTO


Art. 4º O procedimento especial de controle aduaneiro previsto nesta Instrução Normativa será instaurado pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil (AFRFB) responsável mediante termo de início, com ciência da pessoa fiscalizada, contendo, dentre outras informações:

I - as possíveis irregularidades que motivaram sua instauração; e

II - as mercadorias ou declarações objeto do procedimento.

§ 1º O disposto no caput não afasta a possibilidade de que o procedimento especial venha a apurar suspeita de irregularidade, nos termos do art. 1º, distinta daquela que motivou a instauração, ou a incluir outras operações, com a ciência do interessado, não especificadas no termo de início.

§ 2º No caso de mercadoria amparada por conhecimento de carga endossado em branco e ainda não submetida a despacho aduaneiro, o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável pela condução do procedimento especial intimará os intervenientes que considerar aptos a identificar o importador e, se for o caso, o adquirente ou encomendante.


Art. 5º A mercadoria submetida ao procedimento especial de controle de que trata esta Instrução Normativa ficará retida até a conclusão do correspondente procedimento de fiscalização.

Parágrafo único. A retenção da mercadoria antes de iniciado o despacho aduaneiro não prejudica a caracterização de abandono, quando for o caso, nem impede o registro da correspondente declaração por iniciativa do interessado. Neste caso, o despacho aduaneiro deverá ser imediatamente interrompido, prosseguindo-se com o procedimento especial.


Art. 6º O Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável pelo procedimento especial de que trata esta Instrução Normativa poderá adotar as seguintes providências, dentre outras que considerar indispensáveis, nos termos da legislação em vigor:

I - realizar diligência ou fiscalização no estabelecimento do interveniente, ou solicitar a sua realização, em caráter prioritário, à unidade de jurisdição aduaneira de zona secundária;

II - encaminhar à Coordenação-Geral de Relações Internacionais (Corin) pedido de requisição de informações à administração aduaneira do país do fornecedor ou ao adido aduaneiro e tributário nele localizado;

 III - solicitar laudo técnico para identificar a mercadoria, inclusive suas matérias-primas constitutivas e obter cotações de preços no mercado internacional;

IV - iniciar procedimento para apurar a veracidade da declaração e autenticidade do certificado de origem das mercadorias, inclusive intimando o importador ou o exportador a apresentar documentação comprobatória sobre a localização, capacidade operacional e processo de fabricação para a produção dos bens importados;

V - solicitar a movimentação financeira do importador, exportador, ou outro interveniente da operação e, se necessário, emitir a correspondente Requisição de Informação sobre a Movimentação Financeira (RMF); e

VI - intimar o importador, exportador, ou outro interveniente na operação, a apresentar informações e documentos adicionais que se mostrem necessários ao andamento dos trabalhos, inclusive os relativos a outras operações de comércio exterior que tenha realizado, observado o disposto na legislação específica e o prazo decadencial.

Parágrafo único. Quando a autoridade competente para expedir a RMF não coincidir com a unidade responsável pela instauração do procedimento especial, aquela deverá encaminhar à esta as informações obtidas sobre a movimentação financeira.

Art. 7º Considerados a conveniência da administração e os recursos disponíveis, o Superintendente Regional da Receita Federal do Brasil poderá designar outra unidade da região fiscal para conduzir o procedimento especial de controle.

Art. 8º No caso de constatação de indícios de incompatibilidade entre os volumes transacionados no comércio exterior e a capacidade econômica e financeira da empresa, no decorrer do procedimento de que trata esta Instrução Normativa, a unidade responsável pelos trabalhos poderá representar à unidade de jurisdição do interessado para que esta avalie a possibilidade de aplicação do procedimento especial previsto na IN SRF nº 228, de 21 de outubro de 2002.

CAPÍTULO III

DA CONCLUSÃO


Art. 9º O procedimento especial previsto nesta Instrução Normativa deverá ser concluído no prazo máximo de 90 (noventa) dias, prorrogáveis por igual período.


§ 1º O curso dos prazos de que trata este artigo ficará suspenso:

I - a partir da data da ciência do interessado de qualquer intimação, voltando a correr no dia do atendimento;

II - nas hipóteses dos incisos II, III, IV e V do art. 6º; casos em que a suspensão do prazo inicia-se no dia do efetivo recebimento do pedido pela Corin ou pelas pessoas referidas naquele artigo, voltando a correr no dia do recebimento de resposta pela unidade da RFB solicitante; e

III - a partir da data da postagem ao fabricante, produtor ou vendedor do país exportador ou produtor de informações e documentos relacionados com a operação sob investigação, voltando a correr no dia do atendimento.

§ 2º A falta de atendimento da intimação a que se refere o § 1º, no prazo de sessenta dias contados da ciência, caracteriza omissão do importador para fins de declaração de abandono, conforme previsto na legislação, ensejando o encerramento do procedimento especial, observado o disposto no art. 11.

 Art. 10. Concluído o procedimento especial e comprovados os ilícitos, lavrar-se-á o correspondente auto de infração com proposta de aplicação da pena de perdimento das mercadorias objeto das operações correspondentes, nos termos da legislação vigente.

Art. 11. O encerramento do procedimento especial não prejudica a aplicação de penalidades às infrações constatadas, inclusive aquelas decorrentes da prática de qualquer ato por parte do importador, exportador, ou outro interveniente, que tenha impedido ou dificultado a condução do procedimento, ou a sua conclusão.

Parágrafo único. O ato previsto no caput deverá ser documentado por meio de termo de constatação, sem prejuízo de aplicação da multa prevista na alínea "c" do inciso IV do art. 107 do Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966, com redação dada pela Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, independentemente de outras penalidades administrativas ou criminais cabíveis.

CAPÍTULO IV

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS


Art. 12. As representações para fins penais decorrentes da fiscalização na forma desta Instrução Normativa deverão observar as disposições da Portaria RFB nº 2.439, de 21 de dezembro de 2010.

Art. 13. O Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil deverá instaurar procedimento administrativo próprio para apuração e aplicação das sanções pertinentes, sem prejuízo, quando for o caso, da correspondente representação fiscal para fins penais, na hipótese de participação do despachante aduaneiro ou de qualquer outro interveniente, conforme definido no § 2º do art. 76 da Lei nº 10.833, de 2003, na prática da infração.

Art. 14. O Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil deverá representar ao seu chefe imediato, com proposta de encaminhamento à unidade de jurisdição do contribuinte para que esta adote as providências necessárias à instauração do devido processo de investigação e auditoria, no caso de constatação de indícios de irregularidade no recolhimento dos tributos internos.

Art. 15. A Coana poderá editar atos complementares a esta Instrução Normativa, em especial quanto à:

I - verificação de faturas e outros documentos no exterior;

II - comprovação de origem das mercadorias nas investigações tendentes a coibir a triangulação de mercadorias (circumvention) para escapar à exigência de direitos comerciais;

 III - hipóteses nas quais poderão ser encaminhadas propostas de realização de diligência no país do fabricante, produtor ou vendedor estrangeiro, para fins de obtenção de informações; e

IIV - verificação do enquadramento dos fatos às hipóteses que levaram ao direcionamento da declaração aduaneira para o canal cinza de seleção na importação, de forma preliminar à instauração de procedimento especial.

Art. 16. Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.


Art. 17. Ficam revogadas a Instrução Normativa SRF nº 52, de 8 de maio de 2001, e a Instrução Normativa SRF nº 206, de 25 de setembro de 2002.



CARLOS ALBERTO FREITAS BARRETO

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Polícia Federal faz operação contra fraudes em importações

A Polícia Federal deflagrou nesta manhã a operação Pomar, para desarticular duas quadrilhas suspeitas de importar mercadorias de modo irregular e remeter divisas ao exterior ilegalmente. As fraudes podem ter causado prejuízo de R$ 1,4 bilhão aos cofres públicos.

A ação, feita em parceria com a Receita Federal, é realizada nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Alagoas, Espírito Santo, Rondônia, Mato Grosso do Sul e Goiás, além do Distrito Federal. Foram expedidos 17 mandados de prisão - sendo 13 de prisão preventiva e 4 de temporária - além de 67 mandados de busca e apreensão.

Segundo a PF, as duas organizações criminosas usavam "laranjas" que abriam empresas para realizar as operações ilegais. A mercadoria entrava no País por diversos portos e depois era armazenada em depósitos na cidade de São Paulo.

Participam da operação 301 policiais federais e 136 auditores da Receita. Os acusados serão indiciados e responderão pelos crimes de descaminho, sonegação fiscal, formação de quadrilha, falsidade ideológica, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.

(aspas)

Fonte : Agência Estado, 28/06/2011

Importação ajuda arrecadação federal

Autor(es): Marta Watanabe | De São Paulo
Valor Econômico - 28/06/2011


Tributação: Até maio o recolhimento do Imposto de Importação cresceu 21,4%, acima da receita total

 O aumento do valor das importações contribuiu para fazer a arrecadação dos tributos federais cobrados no desembaraço de mercadorias crescer em velocidade maior que a média.

Com R$ 10 bilhões arrecadados no acumulado de janeiro a maio, o Imposto de Importação teve elevação real de 21,3% na comparação com o mesmo período do ano passado. O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) vinculado à importação teve crescimento real menor, de 17%, mas mesmo assim os dois tributos tiveram um desempenho melhor do que o total da arrecadação da Receita Federal, que aumentou em termos reais em 11,33% no mesmo período. Os dados levam em conta a arrecadação atualizada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

O PIS e a Cofins recolhidos na importação também tiveram melhor desempenho que a arrecadação geral das duas contribuições. Enquanto os desembarques renderam 10,7% de elevação no recolhimento de PIS e Cofins, o total com os dois tributos cresceu 9,63%. A receita auferida com esses tributos sobre importação representa atualmente 8% da arrecadação total administrada pela Receita. O crescimento da arrecadação sobre importação tem crescido mesmo com a valorização da moeda nacional em relação ao dólar, o que ajuda a reduzir o valor da base tributável calculada em reais. A valorização do real, porém, tem estimulado as importações, o que tem resultado em um ritmo forte de crescimento do valor importado.

Nos primeiros cinco meses do ano, o valor das importações em dólar cresceu 29%, na comparação com o mesmo período do ano passado. O volume de importação continua crescente, apesar do ritmo ter diminuído em relação a 2010. A evolução do valor importado, porém, reflete também o aumento de preços em dólar nos desembarques. Por conta do repasse da inflação e como reflexo da elevação de preços das commodities no mercado internacional, os preços das importações têm crescido em ritmo mais acelerado.

Os tributos sobre importação também tiveram desempenho acima da média. Os demais recolhimento tiveram arrecadação afetada pela desaceleração da atividade industrial nos últimos meses.

Amir Khair, especialista em contas públicas, acredita que o desempenho da arrecadação sobre importações reflete a oportunidade aberta pelo câmbio a fornecedores externos que querem entrar no mercado brasileiro. Esses fornecedores, diz, estão trazendo produtos interessantes para o consumidor brasileiro e com preços competitivos. Os carros chineses, aponta, são um exemplo disso. Ao mesmo tempo em que o câmbio facilita as importações, argumenta Khair, a taxa de juros tem contribuído para a desaceleração da produção industrial.

"É possível que parte da importação esteja substituindo os industrializados brasileiros, o que está dando aos tributos cobrados sobre importação uma taxa de crescimento maior que para os demais tributos", diz o consultor e ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel.

Maciel observa, porém, que na ponta, na comparação de maio de 2011 contra maio do ano passado, o desempenho do IPI se descolou do recolhimento do Imposto de Importação.

Em maio o crescimento real da arrecadação do Imposto de Importação cresceu 21,7%, na comparação com o mesmo mês de 2010, enquanto o IPI teve elevação real de apenas 7,6% no mesmo período. Isso, explica Everardo, está relacionado à natureza, das importações, com itens sujeitos a uma tributação maior do Imposto de Importação do que do IPI.

O advogado Rogerio Zarattini Chebabi, do escritório Braga e Marafon Consultores e Advogados, explica que a redução ou a aplicação de alíquota zero de IPI é utilizada como forma de estímulo ao investimento ou ao desenvolvimento de determinados setores. Ele lembra que os bens de capital costumam ter alíquota menor de IPI e muitas vezes ficam livres do imposto na importação. "A alíquota média do Imposto de Importação é de 14% e é o imposto mais pesado no desembaraço aduaneiro."

Khair ressalta, porém, que apesar de um ritmo maior de crescimento da arrecadação dos tributos sobre importações, a arrecadação federal ainda continua tendo como uma de suas principais fontes a massa salarial.

Maersk cobrará multa para contêineres no-show

Taxa será de US$ 100 para contêiner seco e US$ 500 para reefer.


A Maersk Line deve começar a cobrar de seus consumidores uma multa para contêineres que tiveram espaço encomendado, mas que não apareceram no embarque. Além disso, a companhia pretende compensar os consumidores por contêineres que tiveram reserva feita mas que a própria empresa não conseguiu carregar no navio.

O CEO da companhia, Eivind Kolding, afirmou que a medida será tomada devido ao alto número de no-shows: "Atualmente, cerca de 30% dos contêineres que fazem reserva com a gente simplesmente não aparece. Essa é a média. Dessa maneira, precisamos fazer algo para evitar o desperdício", disse.

O executivo enfatizou ainda que a Mersk tentará alterar o comportamento de no-shows cobrando o que ele chamou de "multa de proteção de carregamento". "Se nós não conseguirmos colocar o contêiner a bordo do navio, nós pagaremos o consumidor. Se o consumidor não aparecer com o contêiner que tem reserva, ele nos pagará. Assim, teremos uma disciplina comportamental maior na indústria", ressaltou Kolding.

A multa aos consumidores será de US$ 100 por contêiner seco e US$ 500 por contêiner reefer que não aparecerem na hora do carregamento.

(aspas)

Fonte : Guia Maritimo, 27/06/2011

segunda-feira, 27 de junho de 2011

O delito de Interposição Fraudulenta de Terceiros na importação e o real alcance da norma

* por Angela Sartori

O Projeto de Lei que redundou na edição da Lei nº 9.613/98 introduziu em nosso ordenamento jurídico o ilícito de interposição fraudulenta de terceiros. A referida norma dispõe sobre os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos.

A definição do delito de interposição fraudulenta no dizer do legislador, corresponde: aquele em que alguém presta-se a intermediar negócio com recursos ou coisas que sabe ser produto de crime antecedente. 

A esse delito foi atribuída uma qualificação de crime equivalente à receptação, como se vê do item 23 da mencionada Exposição de Motivos da referida Lei:

23. O projeto, desta forma, mantém sob a égide do artigo 180 do Código Penal, que define o crime de receptação, as condutas que tenham por objeto a aquisição, o recebimento ou a ocultação, em proveito próprio ou alheio, de coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.  Fica, portanto, sob o comando desse dispositivo a grande variedade de ilícitos parasitários de crimes contra o patrimônio.

Do exposto, a interposição fraudulenta corresponderia a um crime conexo, posto que praticado na intenção de ocultar coisa ou dinheiro que tem como origem um dos crimes elencados no artigo 1º da Lei nº 9.613/98, portanto pressupõe um crime antecedente, como por exemplo: tráfico de drogas; terrorismo; contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção; de extorsão mediante seqüestro; contra a administração pública (corrupção); contra o sistema financeiro nacional; praticado por organização criminosa.

O artigo 1º, § 1º, inciso III da Lei nº 9.613/98 dispõe que aquele que importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos reais pode estar praticando, nos termos dessa lei, uma interposição fraudulenta. Este é o teor do referido artigo:

§ 1º - Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de qualquer dos crimes antecedentes referidos neste artigo:
I - os converte em ativos lícitos;
II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere;
III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.

Portanto, a condição para aplicação do artigo acima é que a interposta pessoa saiba que os recursos financeiros empregados nas operações tem origem em um dos crimes antecedentes tipificados no artigo 1º da referida Lei. Vale aduzir que nessa conduta o dolo é essencial, portanto, a intenção criminal  há de restar comprovada.

Há de reconhecer-se que essa tipologia infracional -  interposição fraudulenta - tipificada no inciso III, parágrafo primeiro, do art.1º da Lei acima exige um NEXO DE CAUSALIDADE entre a interposta pessoa e o crime antecedente.  Sem essa vinculação, que há de ser dolosa, não poderá se configurar crime algum. 

Como a referida Lei nº 9.613/98 é um instrumento com poder de coação, procurou repudiar, os possíveis desvios de conduta. Por isso os autores da Exposição de Motivos nº 692/MJ, previnem os administrados contra a generalização, nos seguintes termos:

"24. Sem esse critério de interpretação (referindo-se à equivalência entre a receptação e a interposição fraudulenta, vide item 23 acima transcrito), o projeto estaria massificando a criminalização para abranger uma infinidade de crimes como antecedentes do tipo de lavagem ou de ocultação.  Assim, o autor do furto de pequeno valor estaria realizando um dos tipos previstos no projeto se ocultasse o valor ou o convertesse em outro bem, como a compra de um relógio, por exemplo."

Neste contexto, desnecessário lembrar que face ao princípio da tipificação cerrada a que se subsume o direito penal, inclusive penal-tributário e penal-aduaneiro, não poderia nenhuma autoridade fiscal afastar-se do rígido trilho legal traçado pelo próprio legislador, nos termos descritos acima. 

Embora expressa essa declaração de princípios não conseguiu o legislador seu intento, pelo menos a julgar pela série de Autos de Infração lavrados pela RFB- Receita Federal do Brasil, sob o pressuposto da prática de interposição fraudulenta, nela incluindo quaisquer suspeitas sobre subfaturamento e outras supostas infrações.  

Atualmente referida infração está disposta no artigo 23 do Decreto-Lei nº 1.455/76, introduzido pelo artigo 59 da Lei nº 10.637/2002 que alterou referido artigo. Dispõe o artigo 23:
Art. 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias:
I - importadas, ao desamparo de guia de importação ou documento de efeito equivalente, quando a sua emissão estiver vedada ou suspensa na forma da legislação específica em vigor;
II - importadas e que forem consideradas abandonadas pelo decurso do prazo de permanência em recintos alfandegados nas seguintes condições:
a) 90 (noventa) dias após a descarga, sem que tenha sido iniciado o seu despacho; ou
b) 60 (sessenta) dias da data da interrupção do despacho por ação ou omissão do importador ou seu representante; ou
c) 60 (sessenta) dias da data da notificação a que se refere o artigo 56 do Decreto- Lei número 37, de 18 de novembro de 1966, nos casos previstos no artigo 55 do mesmo Decreto-lei; ou
d) 45 (quarenta e cinco) dias após esgotar-se o prazo fixado para permanência em entreposto aduaneiro ou recinto alfandegado situado na zona secundária.
III - trazidas do exterior como bagagem, acompanhada ou desacompanhada e que permanecerem nos recintos alfandegados por prazo superior a 45 (quarenta e cinco) dias, sem que o passageiro inicie a promoção, do seu desembaraço;
IV - enquadradas nas hipóteses previstas nas alíneas "a" e "b" do parágrafo único do artigo 104 e nos incisos I a XIX do artigo 105, do Decreto-lei número 37, de 18 de novembro de 1966.
V - estrangeiras ou nacionais, na importação ou na exportação, na hipótese de ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros.

Com efeito, o Regulamento Aduaneiro, Decreto nº 6.759/2009, artigo 801 e as Instruções Normativas SRF nº 206 e nº 228, ambas de 2002, vieram regulamentar referida infração. No entanto, acabam enquadrando, quaisquer operações realizadas através de intermediários, como Trading Companies numa sistemática burocrática correndo o risco de serem alvo de ações fiscais, bastando um equívoco documental, um erro procedimental, para que se retenha a mercadoria, vislumbrando o crime de interposição fraudulenta.

Assim, começa-se o processo administrativo pela retenção da mercadoria que se mantém até o fim do procedimento fiscal, que poderá redundar na pena de perdimento para o importador e multa de 10% sobre o valor da operação supostamente acobertada. O auditor fiscal poderá interpretar que uma simples infração é um conluio, uma fraude ou uma simulação, pelo princípio de que toda infração é objetiva, primeiro se conclui pela conduta fraudulenta para depois se apurar seu eventual cometimento. 

Com isso infelizmente massifica-se, generaliza-se e criminalizam-se condutas que, sob qualquer ótica, não configuram crime de interposição fraudulenta, nos termos da Lei de regência.

Trata-se, de um desvio de finalidade de norma, claramente estampado no parágrafo 1º, do artigo 1º, da IN SRF nº 228/02, que acrescentou à finalidade originária (combate ao crime de lavagem) um adendo para incluir também os responsáveis por infração à legislação em vigor. Dispõe referida norma: 

"Art. 1º As empresas que revelarem indícios de incompatibilidade entre os volumes transacionados no comércio exterior e a capacidade econômica e financeira evidenciada ficarão sujeitas a procedimento especial de fiscalização, nos termos desta Instrução Normativa.


§ 1º O procedimento especial a que se refere o caput visa a identificar e coibir a ação fraudulenta de interpostas pessoas em operações de comércio exterior, como meio de dificultar a verificação da origem dos recursos aplicados, ou dos responsáveis por infração à legislação em vigor."

Portanto, a INSRF nº 228 estendeu a tipificação do crime de interposição fraudulenta originária, descrito na Lei  do tipo cerrado  para uma tipificação aberta de tal sorte que, a partir dessa normativa, toda e qualquer infração à legislação em vigor  vale dizer, tudo o que nela se contém  pode vir a constituir-se, em crime passível de justificar a pena de perdimento de bens.

Esse poder de confiscar bens do administrado/contribuinte  presta-se, muitas vezes a distorcer o conceito do que seja uma importação fraudulenta, pois acaba se incluindo no escopo da norma, ilícitos puramente fiscais suscetíveis de serem equacionados e combatidos pela via da própria legislação ordinária. 

Assim, por exemplo, o subfaturamento ou valoração da base de cálculo do imposto de importação, a inexatidão documental e outras tantas figuras que caracterizam infrações aduaneiras simplesmente, acabam sendo interpretado como crime de interposição fraudulenta, o que significa uma notória generalização e conseqüente criminalização dessas situações.  Exatamente o que legislador, a julgar pela Exposição de Motivos nº 692/96 pretendia evitar.

Embora isso, ao Executivo se atribuiu a função judicante (rito do perdimento instrumentalizado pelo Decreto-Lei nº 1.455/76) e a competência condenatória  imposição da sanção de perdimento, por força da Medida Provisória nº 66 (artigos 59 a 60) que redundou na edição da Lei nº 10.637/04, que mandou acrescer a interposição fraudulenta no corpo do artigo 23 do Decreto  Lei nº 1.455/76. É possível, que o Poder Legislativo não tenha se atentado para esse dispositivo legal com o ditame da Lei nº 9.613/98, estabelecendo assim um conflito de competências para julgar e apreender bens, tendo em vista que o artigo 2, inciso III da referida norma que dispõe tal atribuição à Justiça Federal.

No entanto, admitindo-se a legalidade da normatização da pena de perdimento aplicada é de se ver que sua tipificação restringe-se a penalizar com o perdimento a interposição fraudulenta da qual resulte o emprego de recursos obtidos ilicitamente por efeitos dos crimes antecedentes nos termos dispostos no artigo 1º, da Lei nº 6.913/98, não autorizando a aplicação dessa sanção a situações que possam configurar outras infrações à legislação em vigor.

De acordo com norma transcrita acima, confirma-se, que a interposição fraudulenta, é uma figura delituosa, que só se define e tipifica relativamente a uma intermediação comercial que vise ocultar, em artifício doloso, o real comprador ou real vendedor, ou ainda o responsável pela operação, sempre que os recursos empregados tenham origem ilícita oriunda de um crime antecedente.

Descabe, pois, nos termos de direito, aplicar a pena de perdimento, ou reter mercadorias a pretexto de que quaisquer outras hipotéticas infrações à legislação aduaneira pudessem configurar a referida interposição fraudulenta.  Assim, uma suspeita de subfaturamento, por exemplo, não se sujeitaria a esse rito procedimental extremo, devendo solucionar-se pelo Acordo de Valoração Aduaneira.  Em síntese, pode-se dizer que outras infrações, se ocorridas, terão que ser solucionadas pela via dos procedimentos já previstos em lei.

Vale transcrever o artigo 33 da Lei nº 11.488/2007, verbis:
Art.33. A pessoa jurídica que ceder seu nome, inclusive mediante a disponibilização de documentos próprios, para a realização de operações de comércio exterior de terceiros com vistas no acobertamento de seus reais intervenientes ou beneficiários fica sujeita a multa de 10% (dez por cento) do valor da operação acobertada, não podendo ser inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Parágrafo único. À hipótese prevista no caput deste artigo não se aplica o disposto no art. 81 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996.

Do artigo acima transcrito, conclui-se que há duas penalidades prevista na norma, a pena de perdimento prevista no Decreto  Lei  nº 1.455 e a multa de 10%, prevista na Lei nº 11.488/2007.

Portanto, nos casos expressamente previstos no artigo 33 acima transcrito, qual seja, ocultação de terceiros para realização de operações de comércio exterior, imperioso é a aplicação da referida norma com penalidade ali prevista que é de multa de 10% sobre o valor da operação e não de perdimento de mercadorias.


Neste sentido é o Acórdão do STJ  Recurso Especial 1.144.751 da Fazenda Nacional  DF (2009/0113764-9)  DJE 15/03/2011:


EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II, DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. DECLARAÇÃO DE INAPTIDÃO DO CADASTRO DO CNPJ DE EMPRESA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ORIGEM DE RECURSOS UTILIZADOS EM OPERAÇÃO DE COMÉRCIO EXTERIOR. INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA (ART. 23, § 2º, DO DL N. 1.455/76 C/C 81, § 2º, DA LEI N. 9.430/96) X CESSÃO DE NOME PARA A REALIZAÇÃO DE OPERAÇÃO DE COMÉRCIO DE TERCEIROS (ART.33 DA LEI N. 11.488/07). VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES E FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO. AFERIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE NA HIPÓTESE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DESTA CORTE.
1. O presente recurso especial originou-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão do juiz a quo que indeferiu o pedido de tutela antecipada formulado
pela empresa em autos de ação ordinária no sentido de determinar o retorno do seu CNPJ à condição de ATIVO.
2. Cumpre afastar a alegada ofensa ao art. 535, II, do CPC, visto que o Tribunal de origem se manifestou de forma clara e fundamentada sobre a questão posta à sua apreciação, ainda que a conclusão adotada tenha sido contrária à pretensão da ora recorrente. A Corte a quo consignou expressamente que a defesa formulada administrativamente pela empresa foi analisada pelo Fisco, porém, as alegações não foram suficientes para impossibilitar a procedência da representação fiscal e a conseqüente suspensão da inscrição do CNPJ da empresa.
3. O Tribunal de origem concluiu que a ausência de comprovação da origem dos recursos utilizados em operação de comércio exterior - que foi tipificada pelo Fisco
como sendo infração de interposição fraudulenta, na forma do art. 23, § 2º, da DL n. 1.455/76 - se equipara à hipótese prevista no art. 33 da Lei n. 11.488/07 que trata da cessão do nome da empresa para a realização de operação de comércio de terceiros com vistas ao acobertamento de seus reais intervenientes ou beneficiários. Segundo o parágrafo único do referido dispositivo, tal infração não é daquelas que permitem a declaração de inaptidão do cadastro no CNPJ prevista no art. 81 da Lei n. 9.430/96.
4. A decisão da Corte a quo apenas deferiu a antecipação de tutela pleiteada, haja vista a verossimilhança das alegações da agravante e o receio de dano irreparável ou de difícil reparação, eis que, conforme consta do relatório do decisum, havia 432,40 toneladas de arroz para exportação paralisadas no Porto de Rio Grande em razão da inaptidão do CNPJ da empresa, impossibilitando o adimplemento de obrigações contratuais assumidas pela ela e exposto o produto ao risco de deteriorar-se. À vista de tal contexto, não é possível a esta Corte infirmar a conclusão adotada no acórdão recorrido, seja porque o conceito de "interposição fraudulenta" trazido pela recorrente nas razões recursais é muito similar ao disposto no art. 33 da Lei n. 11.488/07, o que recomenda o deferimento da tutela de urgência pleiteada pela empresa a fim de reativar seu CNPJ até a decisão de mérito na ação ordinária, seja porque o desenvolvimento dos requisitos do art. 273 do CPC, para fins de concessão de tutela antecipada, é providência que encontra óbice no teor da Súmula n. 7 desta Corte.
5. Recurso especial não provido.

Diante de todo o exposto, entendemos que a pena de perdimento aplicada aos casos de interposição fraudulenta só exsurge no mundo jurídico quando praticada ao fito de ocultar dinheiro ilícito, fruto de crime antecedente, nos termos do artigo 1 da Lei nº 9.613/1998. Nesta hipótese ocorrendo o processo administrativo, rito previsto na INSRF nº 228 para inaptidão do CNPJ. Sua invocação, nos demais casos, só se justifica pelo arbítrio.

* Angela Sartori é advogada e consultora na área de comércio exterior, membro do CARF - Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda, professora de MBA da USP  Promimp, matéria Importação, Especialista em Direito Tributário, pela PUC/SP e Extensão em Direito Internacional, das Relações Econômicas e do Comércio pela FGV/GVLaw, autora do livro Drawback e o Comércio Exterior - Editora Aduaneiras, diretora do ICEX.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Possibilidade de questionamento judicial da majoração da taxa de utilização do Siscomex

Ao final do mês de maio de 2010, nos dias 23.05.2011 e 26.05.2011, foram publicados dois normativos que majoraram a Taxa de Utilização do Sistema Integrado do Comércio Exterior (SISCOMEX).

Esses normativos determinam que, para as empresas que efetuam operações de importação, serão devidos R$ 185,00, a título de taxa, por ato de registro de cada Declaração de Importação, bem como outros valores por adição.

Anteriormente a esses novos normativos, eram devidos R$ 30,00 por Declaração de Importação, e os valores por adição eram muito mais baixo do que os vigentes agora.

Observa-se que a majoração dessa taxa, por meio de portaria ou instrução normativa, não é legítima, uma vez que o veículo normativo utilizado para determinar essa majoração, quais sejam Portaria e Instrução Normativa, não guardam obediência ao princípio da legalidade, ao princípio da anterioridade, além de se verificar a falta de proporcionalidade da majoração dessa taxa.

Nessa medida, verifica-se que, pelo fato dessa taxa ter inegavelmente a natureza tributária, há grave ferimento destes princípios acima mencionados, além de outros dispositivos constitucionais e legais.

Além do questionamento da majoração dessa taxa, é possível também observar que a base legal que sustenta a cobrança desse tributo foi alterada de forma ilegítima, sendo que é possível ainda requerer a devolução dos valores pagos via restituição ou compensação com outros tributos federais.

Embora diversos órgãos representativos de classe tenham divulgado que iriam utilizar instrumentos de negociação com o Governo Federal, até o momento, nenhuma medida concreta foi verificada.

Entendemos que cabe uma medida judicial, senão para afastar a cobrança por completo, pelo menos deixá-la em um valor justo.

Rogerio Zarattini Chebabi
Advogado Aduaneiro

rogerio@chebabi.net

Veja a íntegra do Acórdão do STF que negou direito do fisco ao acesso a dados bancários de contribuinte

www.comexdata.com.br (assinem!!)

25/05/2011

Íntegra do Acórdão no RE 389.808/PR


Recurso Extraordinário 389.808 Paraná
Relator: Min. Marco Aurélio
Recte.(s): G.V.A. S/A
Recdo.(a/s): União

SIGILO DE DADOS - AFASTAMENTO. Conforme disposto no inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal, a regra é a privacidade quanto à correspondência, às comunicações telegráficas, aos dados e às comunicações, ficando a exceção - a quebra do sigilo - submetida ao crivo de órgão equidistante - o Judiciário - e, mesmo assim, para efeito de investigação criminal ou instrução processual penal.

SIGILO DE DADOS BANCÁRIOS - RECEITA FEDERAL. Conflita com a Carta da República norma legal atribuindo à Receita Federal -parte na relação jurídico-tributária - o afastamento do sigilo de dados relativos ao contribuinte.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal em dar provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto do relator e por maioria, em sessão presidida pelo Ministro Cezar Peluso, na conformidade da ata do julgamento e das respectivas notas taquigráficas.

Brasília, 15 de dezembro de 2010.



RELATÓRIO


O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - O Tribunal Regional Federal da 4a Região negou acolhida a pedido formulado em apelação, ante os fundamentos assim sintetizados (folha 147):

TRIBUTÁRIO. REPASSE DE DADOS RELATIVOS À CPMF PARA FINS DE FISCALIZAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. SIGILO BANCÁRIO.

O acesso da autoridade fiscal a dados relativos à movimentação financeira dos contribuintes, no bojo de procedimento fiscal regularmente instaurado, não afronta, a priori, os direitos e garantias individuais de inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas e de inviolabilidade do sigilo de dados, assegurados no art. 5o, incisos X e XII, da CF/88, conforme entendimento sedimentado no tribunal.

No plano infraconstitucional, a legislação prevê o repasse de informações relativas a operações bancárias pela instituição financeira à autoridade fazendária, bem como a possibilidade de utilização dessas informações para instaurar procedimento administrativo tendente a verificar a existência de crédito tributário relativo a imposto e contribuições e para lançamento do crédito tributário porventura existente (Lei 8.021/90, Lei 9.311/96, Lei 10.174/2001, Lei complementar ns 105/2001).

As disposições da Lei 10.174/2001 relativas à utilização das informações da CPMF para fins de instauração de procedimento fiscal relacionado a outros tributos não se restringem a fatos geradores ocorridos posteriormente à edição da lei, pois, nos termos do art. 144, § Io, do CTN, aplica-se ao lançamento a legislação que, posteriormente à ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliando os poderes de investigação das autoridades administrativas. Apelação desprovida.

No recurso extraordinário de folha 161 a 179, interposto com alegada base na alínea "a" do permissivo constitucional, a GVA Indústria e Comércio S.A. articula com a transgressão aos incisos X e XII do artigo 5a da Carta da República e alude à jurisprudência das últimas décadas, em sentido contrário à posição adotada no acórdão impugnado. Assevera que a "inviolabilidade das garantias individuais constitucionalmente asseguradas constitui um dos núcleos básicos em que se desenvolve, em nosso País, o regime das liberdades públicas" (folha 166). Sustenta que, apesar de tais garantias, até mesmo às relativas à intimidade e ao sigilo de dados, não serem absolutas, o afastamento destas, em situações excepcionais, não prescinde de autorização judicial. Nesse passo, salienta que "não se apresenta possível e legítima a outorga de poder a qualquer órgão estatal da República, para que passe a desempenhar atribuição exclusiva do Poder judiciário, sob pena, inclusive, de violação aos princípios do juiz natural, do duplo grau de jurisdição, da independência e autonomia dos poderes e da inafastabilidade do controle jurisdicional" (folha 169).

A União, nas contrarrazões de folha 182 a 205, discorre sobre a harmonia da Lei nº. 10.174/2001 com a Constituição Federal.

O  procedimento  atinente  ao juízo  primeiro  de  admissibilidade encontra-se à folha 207.

Em 5 de julho de 2003, deferi a liminar postulada na Ação Cautelar ng 33-5. O inteiro teor do ato é o seguinte (folhas 212 e 213):

JURISDIÇÃO - PODER DE CAUTELA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO EFICÁCIA SUSPENSIVA - LIMINAR -SIGILO DE DADOS BANCÁRIOS -AFASTAMENTO - RISCO - ARTIGO 6» DA LEI COMPLEMENTAR N° 105/2001 -ARTIGOS 4o E 5a DO DECRETO N» 3.724/2001 - CONSTITUCIONALIDADE DECLARADA - AÇÃO CAUTELAR -LIMINAR DEFERIDA.

1. Esta ação cautelar visa a imprimir efeito suspensivo a recurso extraordinário interposto e distribuído - Recurso Extraordinário n- 389.808. Chega a esta Corte o tema relativo à quebra do sigilo bancário pelo Fisco, a merecer reflexão maior ante o inciso XII do artigo 5S da Constituição Federal, no que revela como regra a inviolabilidade do sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, contemplando exceção condicionada a ordem judicial. Há de se preservar campo propício a possível decisão favorável à requerente e, portanto, ao pronunciamento do Supremo Tribunal Federal como guarda da Carta da República. Quebrado o sigilo por iniciativa do Fisco, parte na relação obrigacional tributária, e conhecido e provido o extraordinário, ter-se-á a ineficácia do provimento jurisdicional. Por isso, surge quadro de excepcionalidade maior a direcionar ao empréstimo de terceiro efeito recursal. Aos efeitos de empecer a coisa julgada (José Carlos Barbosa Moreira) e devolutivo, tudo recomenda que se adite o da suspensão de eficácia do acórdão proferido, procedendo-se de forma ativa, ou seja, para afastar a quebra do sigilo, no que desprovida de ordem judicial.

2.  Defiro a liminar pleiteada, obstaculizando, até a decisão final   do   extraordinário,   o fornecimento   de   informações bancárias da requerente à Receita.

3.  Dê-se ciência desta decisão à União, citando-a para o conhecimento   da   ação  proposta.   Caso  já   tenha   havido   o fornecimento das informações bancárias, observe-se o sigilo,
congelando-se a obtenção dos dados,  que não  poderão  ser acionados para os efeitos pretendidos.

4.   Encaminhe-se,   por  fac-símile,   o   inteiro   teor   desta decisão   à   União   e   à   Receita   Federal,   sem   prejuízo   da pessoalidade    imposta    por    lei.    Imprima-se urgência    na degravação e revisão desta decisão.

5.  Junte-se cópia deste ato ao processo em que interposto o
Recurso Extraordinário ne 389.808/PR.

6.  Publique-se.
Em 24 de novembro de 2010, por uma votação apertada de seis votos a quatro - vencidos os Ministros Cezar Peluso, Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e eu próprio -, o Tribunal negou referendo à medida acauteladora.

A Procuradoria Geral da República, no parecer de folha 224 a 229, preconiza o desprovimento do recurso.
E o relatório.

VOTO


O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Na interposição deste recurso, foram observados os pressupostos gerais de recorribilidade. Os documentos de folhas 26 e 110 revelam a regularidade da representação processual e do preparo. Quanto à manifestação do inconformismo, respeitou-se o prazo de quinze dias assinado em lei.

É sempre oportuno atentar para os princípios consagrados na Carta Maior. A República Federativa do Brasil tem como fundamento a dignidade da pessoa humana - artigo 1º, inciso III -, estando as relações internacionais norteadas pela prevalência dos direitos humanos - artigo 4Q, inciso II. A vida gregária pressupõe segurança - artigos 5Ü e 6tt -, pressupõe estabilidade, e não a surpresa. No rol das garantias constitucionais de que desfrutam brasileiros e estrangeiros residentes no país, figura a inviolabilidade do sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas -inciso XII. O acesso ao Judiciário consta desse mesmo rol, visando a afastar lesão ou ameaça de lesão a direito - inciso XXXV. Por isso mesmo consubstancia tipo penal fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permita - artigo 345 do Código Penal. A referência a lei, a encerrar observância do princípio da legalidade, medula em um Estado que se diga Democrático de Direito, remete à necessária harmonia com o texto constitucional.

Relativamente à inviolabilidade referida, a Constituição Federal prevê exceções. A primeira faz-se ao mundo jurídico considerado o primado do Judiciário. A este, mediante ato fundamentado, nas hipóteses e forma contempladas em lei, é dado afastá-la e, mesmo assim, com finalidade única, ou seja, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Muito embora do preceito conste a exceção quanto às comunicações telefônicas, a sedimentada jurisprudência revela poder a ordem judicial alcançar o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas e de dados - Habeas Corpus nQ 70.814/SP, da relatoria do Ministro Celso de Mello, e o Recurso Extraordinário 418.416/SC, da relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence, cujos acórdãos foram publicados no Diário da Justiça de 24 de junho de 1994 e de 19 de dezembro de 2006, respectivamente.

Nota-se, ante remissão contida no artigo 58, § 3S, da Lei Maior, que as comissões parlamentares de inquérito atuam com poderes de investigação próprios das autoridades judiciais. Em síntese, a regra é assegurar a privacidade das correspondências bem como das comunicações telegráficas de dados e telefônicas, correndo à conta de exceção a possibilidade de ser mitigada por ordem judicial para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Já aqui surge a conclusão sobre a inviabilidade de estender-se a exceção, quando se tratar de outras finalidades que não a ligada à investigação criminal ou à instrução processual penal. A razão do preceito mostra-se única -resguardar o cidadão de atos extravagantes que possam, de alguma forma, alcançá-lo na dignidade. Então, apenas se permite o afastamento do sigilo mediante ato de órgão equidistante, mediante ato do Estado-juiz, que não figura em relação jurídica a envolver interesses, e, mesmo assim, para efeito de persecução criminal.

Idêntica premissa pode ser assentada quanto às comissões parlamentares de inquérito. Em tal sentido tem sido a jurisprudência do Supremo. E certo que, no Mandado de Segurança n° 21.729-4, do qual fui relator, sendo designado para redigir o acórdão o Ministro Néri da Silveira, abriu-se uma exceção, relativa à atuação direta do Procurador-Geral da República no tocante a investigação concernente a verbas públicas. Proclamou-se, então, em 1995: "Não cabe ao Banco do Brasil negar ao Ministério Público informações sobre nomes de beneficiários de empréstimos concedidos pela instituição, com recursos subsidiados pelo erário federal, sob invocação do sigilo bancário, em se tratando de requisição de informações e documentos para instruir procedimento administrativo instaurado em defesa do patrimônio público".

Admitiu-se a primeira exceção estranha ao texto constitucional. Na oportunidade, manifestei entendimento contrário, sendo acompanhado pelos Ministros Maurício Corrêa, Celso de Mello, limar Galvão e Carlos Velloso. Potencializou-se, a meu ver, a mais não poder - e por seis votos a cinco, por maioria de apenas um voto, como ocorreu na surpreendente cassação da liminar neste caso, seis a quatro, conforme consignado no relatório -, o que seria não o interesse público primário, mas o secundário quanto às verbas envolvidas na espécie. De qualquer forma, ficou delimitado o acesso direto proporcionado ao Procurador-Geral da República, fiscal da lei e titular exclusivo da ação penal pública perante o Supremo, que não se confunde com a Receita Federal. Esta é parte na relação jurídico-tributária, surgindo o interesse fiscal-arrecadador. Restringiu-se o acesso à movimentação de verbas públicas.

Em 26 de setembro de 2001, o Tribunal, no julgamento do Mandado de Segurança nB 23.851/DF, examinou situação jurídica em que a quebra de sigilo viria a decorrer, se admitida, de ato de comissão parlamentar de inquérito. Ressaltou o relator, Ministro Celso de Mello, que a medida não pode ser utilizada como instrumento de devassa indiscriminada, sob pena de ofensa à garantia constitucional da intimidade:

A quebra de sigilo, para legitimar-se em face do sistema jurídico-constitucional brasileiro, necessita apoiar-se em decisão revestida de fundamentação adequada, que encontre apoio concreto em suporte fático idôneo, sob pena de invalidade do ato estatal que a decreta.

A ruptura da esfera de intimidade de qualquer pessoa -quando ausente a hipótese configuradora de causa provável -revela-se incompatível com o modelo consagrado na constituição da república, pois a quebra de sigilo não pode ser manipulada, de modo arbitrário, pelo Poder Público ou por seus agentes, não fosse assim, a quebra de sigilo converter-se-ia, ilegitimamente, em instrumento de busca generalizada, que daria, ao Estado - não obstante a ausência de quaisquer indícios concretos - o poder de vasculhar registros sigilosos alheios, em ordem    a    viabilizar,    mediante    a    ilícita    utilização    do procedimento de devassa indiscriminada (que nem mesmo o judiciário pode ordenar), o acesso a dado supostamente impregnado de relevo jurídico-probatório, em função dos elementos informativos que viessem a ser eventualmente descobertos.

A fundamentação da quebra de sigilo há de ser contemporânea à própria deliberação legislativa que a decreta.

A exigência de motivação - que há de ser contemporânea ao ato da Comissão Parlamentar de Inquérito que ordena a quebra de sigilo - qualifica-se como pressuposto de validade jurídica da própria deliberação emanada desse órgão de investigação legislativa, não podendo ser por este suprida, em momento ulterior, quando da prestação de informações em sede mandamental.

Somei o meu voto ao do relator e o entendimento mostrou-se unânime.

Voltou o Plenário a enfrentar a matéria quando do julgamento do Mandado de Segurança nQ 22.801-6, impetrado pelo Banco Central do Brasil e por Gustavo Jorge Laboissière Loyola contra ato do Tribunal de Contas da União. O saudoso Ministro Menezes Direito, relator, fez ver, em 17 de dezembro de 2007, que a Lei Complementar nQ 105, de 10 de janeiro de 2001, não conferiu ao Tribunal de Contas da União - órgão que não guarda a qualidade de parte, mas a natureza fiscalizatória relativamente ao interesse público - o poder de determinar a quebra do sigilo bancário e de dados constantes do Banco Central do Brasil. Mais uma vez, o pronunciamento foi unânime.

Este Colegiado, em 27 de agosto de 2009, apreciando a Petição n° 3.898, do então momentoso caso Francenildo, ressaltou a eficácia constitucional do sigilo bancário. O relator, Ministro Gilmar Mendes, na ementa elaborada, consignou que:

(...)

5.  O Ministro da Fazenda e seu assessor de imprensa não figuram dentre os agentes integrantes da cadeia de pessoas autorizadas,    em   lei   ou   regulamento,    a    conhecer,    por transferência, dados cobertos pelo sigilo bancário.

6.  Existência de base empírica para a configuração de justa causa para a ação penal em relação ao então Presidente da Caixa Econômica Federal. Embora tendo a posse legítima de
informações acobertadas pelo sigilo bancário, o denunciado as revelou indevidamente ao então Ministro da Fazenda, pessoa não autorizada a conhecê-las.

(...)

8. Denúncia rejeitada em relação ao ex-Ministro da Fazenda e assessor de imprensa do mesmo Ministério e recebida quanto ao então Presidente da Caixa Econômica Federal.

Ficou assentado que nem mesmo o Ministro de Estado da Fazenda poderia ter acesso a dados bancários de certo cidadão - individualizado -existentes na Caixa Econômica Federal. Vê-se que, apesar desse pronunciamento, no caso ora analisado, o Tribunal de origem, olvidando a reserva ao Judiciário prevista na Constituição Federal, placitou esse acesso por um órgão subordinado ao citado Ministério, ou seja, a Receita Federal.

A Primeira Turma do Supremo também teve a oportunidade de examinar o tema presente a atuação não cobradora, como ocorre com a Receita, fiscalista por excelência, mas fiscalizadora do Banco Central. Em 3 de agosto de 2007, julgando o Recurso Extraordinário nc 461.366-2/DF, de minha relataria, fez ver:

SIGILO DE DADOS - ATUAÇÃO FISCALIZADORA DO BANCO CENTRAL - AFASTAMENTO - INVIABILIDADE. A atuação fiscalizadora do Banco Central do Brasil não encerra a possibilidade de, no campo administrativo, alcançar dados bancários de correntistas, afastando o sigilo previsto no inciso XII do artigo 5S da Constituição Federal.

Na ocasião, reconheço, ficaram vencidos os Ministros Sepúlveda Pertence, Presidente, e Carlos Ayres Britto.

As questões envolvidas na espécie são muitas. A primeira delas diz respeito à rigidez, a acarretar a supremacia, da Constituição Federal. Ato normativo abstrato autônomo há de respeitar o que nela se contém.

O segundo aspecto tem ligação com o primado do Judiciário. Não se pode transferir a atuação deste, reservada com exclusividade por cláusula constitucional, a outros órgãos, sejam da administração federal, sejam da estadual, sejam da municipal. Vale notar que, nesses dois últimos patamares, também existem entidades cujo objeto, cuja destinação, assemelha-se à da Receita Federal. Admitindo-se que a Receita Federal pode ter acesso direto, por que meio for, a dados bancários de certo cidadão, dever-se-á caminhar no mesmo sentido, por coerência sistêmica, para dar idêntico poder às Receitas estadual e municipal.

A terceira questão a ser considerada concerne à denominada prerrogativa de foro. Detendo-a o cidadão, só pode ter o sigilo afastado ante a atuação, fundamentada, do órgão Judiciário competente, mas, até aqui, segundo o acórdão impugnado mediante este extraordinário, ombreiam, em despropósito insuplantável, o Judiciário e a Receita Federal. Em síntese: ainda que o correntista goze da prerrogativa de ser julgado criminalmente pelo Supremo, este sim autorizado constitucionalmente a quebrar-lhe o sigilo de dados bancários, a Receita poderá fazê-lo não para efeitos criminais, mas de cobrança de tributos, fato que revelará verdadeira coação política na cobrança de tributos, a contrariar jurisprudência sedimentada - Verbetes nQ 70, n° 323 e nQ 547 cia Súmula do Supremo:

VERBETE N° 70
É INADMISSÍVEL A INTERDIÇÃO DE ESTABELECIMENTO COMO MEIO COERCITIVO PARA COBRANÇA DE TRIBUTO.

VERBETE Nº 323
É INADMISSÍVEL A APREENSÃO DE MERCADORIAS COMO MEIO COERCITIVO PARA PAGAMENTO DE TRIBUTOS.

VERBETE N° 547
NÃO É LÍCITO À AUTORIDADE PROIBIR QUE O CONTRIBUINTE EM DÉBITO ADQUIRA ESTAMPILHAS, DESPACHE MERCADORIAS NAS ALFÂNDEGAS E EXERÇA SUAS ATIVIDADES PROFISSIONAIS.

O passo banaliza o que a Constituição Federal quer protegido - a privacidade do cidadão, irmã gêmea da dignidade a ele assegurada mediante princípios explícitos e implícitos.

Assentando que preceitos legais atinentes ao sigilo de dados bancários hão de merecer, sempre e sempre, interpretação, por mais que se potencialize o objetivo, harmônica com a Carta da República, provejo o recurso extraordinário interposto para conceder a segurança. Defiro a ordem para afastar a possibilidade de a Receita Federal ter acesso direto aos dados bancários da recorrente. Com isso, confiro à legislação de regência - Lei n° 9.311/96, Lei Complementar n° 105/01 e Decreto n° 3.724/01 - interpretação conforme à Carta Federal, tendo como conflitante com esta a que implique afastamento do sigilo bancário do cidadão, da pessoa natural ou da jurídica, sem ordem emanada do Judiciário.


VOTO


O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Senhor Presidente, vou pedir vênia ao eminente Relator para, na linha de como já votei ao julgar a Ação Cautelar nº 33, negar provimento ao recurso extraordinário. E o faço pelos seguintes fundamentos, que agrego àquele voto anteriormente dado quando da análise cautelar.

O fundamento do extraordinário é o artigo 5e, incisos X e XI, da Constituição: a inviolabilidade e a intimidade da vida privada, da honra, da imagem e a inviolabilidade do sigilo e dos dados.

Mas vou ao art. 145 da Constituição, dispositivo originariamente promulgado em conjunto com aqueles dos incisos X e XII do artigo 5º.

O § 1º do artigo 145 dispõe, em síntese, que a administração tributária poderá "identificar, respeitados os direitos e garantias individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte".

E temos a lei. E a lei está a respeitar - depois vou desenvolver os dispositivos legais - os direitos e garantias individuais? Digo que está, exatamente quando ela criminaliza a quebra. Aqui, no caso em julgamento, não há que se falar de quebra de sigilo, há que se falar de transferência do dever de manter o sigilo, porque a quebra é crime, é ilícito.

Destaco, também, Senhor Presidente, que a Constituição muito sabiamente distingue acesso a patrimônio e rendimentos e atividades econômicas.

Qual o conjunto maior de patrimônio que temos, todos os cidadãos? Nossos bens, os quais nós somos compelidos a declarar ao Estado brasileiro, à Secretaria da Receita Federal do Brasil, por obrigação legal; não por ordem judicial.

A Receita Federal já detém o conjunto maior, que corresponde à declaração   do   conjunto   total  de   nossos  bens.   No   nosso   caso,essa obrigação anual se dá por força de lei, ex leges, não por força de decisão judicial. Se esse não fosse o caso, a Receita Federal teria, todo ano, de acionar o Judiciário para que ele compelisse os cidadãos brasileiros a apresentar anualmente a sua declaração de bens, declaração do patrimônio total de bens. Esse é o conjunto maior; a atividade econômica, que é a movimentação bancária, é o conjunto menor.

Se a Receita Federal tem acesso ao conjunto maior, como ela não pode ter acesso ao conjunto menor? E o § Ia do artigo 145 muito sabiamente ressalvou: "identificar, respeitados os direitos individuais (...)". Ora, data vênia, a lei respeita; e penaliza a administração pública se o ilícito ocorreu por ordem superior, se houve conivência. Lerei, novamente, os dispositivos. "[A administração poderá] identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas (...)". O que estamos a dizer sobre a atividade econômica, a movimentação bancária? Que é lícita a identificação, conforme o § ls do artigo 145 da Constituição Federal. Por quê? Porque a lei que regra o dispositivo... e aqui vou além, vou aos artigos 10 e 11 a Lei Complementar ns 105.

Diz o artigo 10:

"Art. 10. A quebra de sigilo, fora das hipóteses autorizadas nesta Lei Complementar (...)"

A Lei comete um ato falho, porque ela fala em quebra de sigilo. Na verdade, aqui, quando se fala em quebra, quer-se dizer transferência do dever de sigilo.

"Art. 10. A quebra de sigilo, fora das hipóteses autorizadas nesta Lei Complementar, constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa, aplicando-se, no que couber, o Código Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.         ?
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem omitir, retardar    injustíficadamente    ou    prestar    falsamente     as informações requeridas nos termos desta Lei Complementar. Art. 11. O servidor público que utilizar ou viabilizar a utilização de qualquer informação obtida em decorrência da quebra de sigilo de que trata essa Lei Complementar responde pessoal e diretamente pelos danos decorrentes, sem prejuízo da responsabilidade objetiva da entidade pública" - ou seja, no caso, o Estado - "quando comprovado que o servidor agiu de acordo com orientação oficial."

Digo eu, e disse isso na cautelar, se houve uma orientação oficial, o ente público será também responsabilizado. Pois bem, nesse sentido o meu entendimento é que aqui não se trata de quebra de sigilo. Trata-se, na verdade, de uma transferência de dados sigilosos de um portador desse dado que tem o dever de sigilo para um outro portador que manterá a obrigação desse sigilo. Se não o mantiver, cometerá crime e será responsabilizado.

A eventual divulgação desses dados dará azo a que incida o tipo penal e permitirá, inclusive, a responsabilização civil e administrativa do infrator; enfim, todas as responsabilizações decorrentes de lei.

Também reforço, aqui, Senhor Presidente, aquilo que já havia dito por ocasião do julgamento da cautelar: não há que se considerar que um gerente de uma instituição privada, um caixa de um banco privado, seja mais responsável do que um auditor fiscal da receita federal do Brasil, que tem todas as responsabilizações e pode perder o seu cargo se descumprir a lei. A maioria dos brasileiros faz movimentação bancária em bancos privados, com caixas de banco, funcionários de bancos, escriturados de bancos, gerentes de bancos tendo acesso total a essas movimentações. Todos com o dever de sigilo. O auditor da receita federal não tem responsabilidade? Tanto o caixa de banco que quebre o sigilo será penalizado quanto o auditor da Receita Federal do Brasil se o fizer.

Por todas essas razões, Senhor Presidente, e verificando que há previsão constitucional e que a lei que regrou a transferência respeita os direitos e garantias fundamentais, tudo nos termos do § 1º do artigo-145 da Constituição e da legislação que regulamenta essa transferência, criminalizando a quebra, eu nego provimento ao recurso, com as vênias ao eminente Ministro Relator.


VOTO


A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Senhor Presidente, também peço vênia ao eminente Ministro-Relator, mas, tal como já votei em outras ocasiões, também não vislumbro, aqui, agressão aos direitos fundamentais, uma vez que não me parece que tenha havido quebra da privacidade; uma vez que não está autorizado por lei a dar a público, mas apenas a transferir para um outro órgão da administração, para o cumprimento das finalidades da Administração Pública, aqueles dados.
Portanto, não me parece absolutamente que tenha havido qualquer inconstitucionalidade sequer para configurar a necessidade de uma interpretação conforme.

Também acho que não há como se dar cobro às finalidades do Estado, especialmente da Administração Fazendária, e até ao Direito Penal, nos casos em que precisa haver investigação e penalização, se não houver acesso a esses dados, que, de toda sorte, já são de conhecimento das instituições financeiras que nem Estado são.

Por essas razões, peço vênia ao eminente Ministro-Relator, acompanho a divergência agora aberta pelo eminente Ministro Dias Toffoli.

*****


Obs.: Texto sem revisão da Exma. Sra. Ministra Cármen Lúcia. (§ 3º do artigo 96 do RISTF, com a redação dada pela Emenda Regimental nº 26, de 22 de outubro de 2008)


VOTO


O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Senhor Presidente, peço vênia à divergência, na esteira de pronunciamentos anteriores, acompanho o Relator.


VOTO


O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - Senhor Presidente, eu peço vênia ao eminente Ministro-Relator para discordar do voto proferido por Sua Excelência. Vou acompanhar a divergência inaugurada pelo Ministro Dias Toffoli.

O meu raciocínio é simples, segue a trilha deixada pelo Ministro Toffoli e parte de uma observação que me parece tranqüila.

A Constituição Federal, em diversas passagens, prestigia o Fisco, desembaraça a atividade fazendária, e eu me permito citar, aqui, o artigo 37, inciso XXII, cuja dicção é esta:

"XXII - as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários para a realização de suas atividades e atuarão de forma integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, na forma da lei ou convênio."

Depois, a Constituição, nessa mesma linha de apreço especial pela atividade do Fisco, fez, no âmbito da Advocacia Pública, um destaque, exatamente para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, no § 3º do artigo 131:

"§ 3º Na execução da dívida ativa de natureza tributária, a representação da União cabe à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, observado o disposto em lei."

Para não maçar os Senhores Ministros, eu também releio o § 1Q do artigo 145, citado pelo Ministro Dias Toffoli, assim redigido:

"§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte," - essa redação é da Constituição originária, inclusive - "facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos" - e vem a parte que mais interessa - "identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei," - aliás há várias leis, dispondo sobre a atuação do Fisco, que não é arbitrária, é obediente a parâmetros objetivos fincados nessas leis - "o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte."

Claro que há uma referência aos direitos individuais - "respeitados os direitos individuais" -, o que nos remete para o artigo 5e, inciso XII:

"XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas (...)" - fico por aqui.

A Constituição usa o substantivo "comunicações" para três atividades ou setores factuais de incidência: comunicações telegráficas, comunicações de dados e comunicações telefônicas. Por que isso? Porque o objetivo da Constituição é preservar a privacidade das pessoas privadas. O que a Constituição não quer é a interceptação da conversa entre pessoas, ou seja, uma interceptação clandestina ou desautorizada. O que a Constituição não quer é que essa interlocução intersubjetiva, essa interlocução entre sujeitos de direitos, seja capturada indevidamente por terceiros. Essa expressão comunicação "de dados" é explicável, porque, hoje em dia, esses "dados" eletrônicos, ou informáticos, se dão na troca de e-mails, no plano das compras pela Internet, transferências bancárias que são feitas eletronicamente, pagamento de títulos, faturas, duplicatas, é isso que a Constituição não quer. É esse meter o bedelho, é essa bisbilhotice, é essa intromissão em conversa alheia. Por quê? Porque essa interlocução entre sujeitos de direito diz com a privacidade de que trata o inciso X do "artigo 59. Se a intimidade significa o indivíduo consigo mesmo, por exemplo, redigindo o seu diário, ele sozinho e a sua consciência, a privacidade significa um relacionamento no âmbito menor de pessoas, como uma troca de e-mails, por exemplo. Isso é expressão de privacidade.

Então me parece que a conjugação do inciso XII com o inciso X da Constituição abona a tese de que o que se proíbe não é o acesso a dados, mas a quebra do sigilo, é o vazamento do conteúdo de dados. É o vazamento, é a divulgação. E, no caso, as leis de regência, ao falar das transferências de dados sigilosos, é evidente que elas impõem ao órgão destinatário desses dados a cláusula da confidencialidade, cuja quebra implica a tipificação ou o cometimento de crime.

Por outro lado, esse tipo de interpretação que se desata do voto do Ministro Dias Toffoli faz, implicitamente, uma distinção muito cara à Ministra Cármen Lúcia e a mim mesmo. Sempre que posso, como a Ministra Cármen Lúcia também, faço uma distinção entre o ser e o ter.

O que o Direito tem em conta cada vez mais, notadamente o Direito Constitucional, é a preservação dos dados do ser.

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Do ser.

O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - Do ser, porque atinentes a bens de personalidade.

Os dados do ter, do patrimônio, dos rendimentos, as atividades econômicas, na sua objetividade, tudo isso é vocacionado para uma abertura. O futuro não vai preservar senão os dados do ser. Os dados do ter serão cada vez mais escancarados, porque patrimônio e renda são obtidos da sociedade, e a sociedade precisa saber o modo pelos quais esses bens, conversíveis em pecúnia, foram obtidos e em que eles consistem. Isso é da lógica natural de uma sociedade que faz da transparência e da visibilidade verdadeiros pilares da democracia.

De maneira que, com essas palavras, desprovejo o recurso, na linha do voto, que tenho como o exemplar, do Ministro Dias Toffoli.

*****

Obs.: Texto sem revisão da Exma. Sra. Ministra Cármen Lúcia. (§ 3º do artigo 96 do RISTF, com a redação dada pela Emenda Regimental n° 26, de 22 de outubro de 2008)


VOTO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - Presidente, já na sessão em que discutimos o tema, eu revelei, um pouco, uma angústia em torno desse assunto.

Inicialmente, eu estava bastante convencido do respaldo constitucional para a providência tomada pela Receita. Isso foi objeto de ampla discussão, e não são poucas as discussões sobre as possibilidades de a Receita fazer esse acesso.

Eu mesmo citava em meu voto, na cautelar, o artigo 145, § l3, que já foi objeto de posicionamento agora, a partir da manifestação do Ministro Dias Toffoli. E a minha dúvida se assentava, inclusive, num aspecto de eficiência da própria Administração. Em vez de pedir ao Judiciário, fazer diretamente.

Ministro Marco Aurélio até chamava atenção para a disciplina, que não está na lei, mas está no decreto, no regulamento desse mandado de fiscalização, que é uma medida importante, uma norma de organização e procedimento, com o objetivo de assegurar certa ordem e de evitar desmandos nesse seara. Mas, depois de ouvir o voto do Ministro Marco Aurélio naquela assentada e, ainda, o voto do Ministro Celso de Mello, eu me fiz a pergunta que, de alguma forma, todos nós podemos nos fazer: Por que há de ser tão difícil, numa matéria que é relevante e tão suscetível a abusos, obter-se essa declaração do próprio Judiciário, diante uma medida cautelar? O que diz o texto constitucional no § 1º do artigo 145: "Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei," - portanto, é um caso típico de reserva legal - "o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte".

No que diz respeito ao acesso à conta com todas as suas conseqüências, não se trata de negar esse acesso, mas simplesmente de exigir - essa é a premissa do voto do Relator e também do voto do Ministro Celso de Mello proferido na cautelar - que, tendo em vista o valor de que se cuida dos direitos fundamentais, haja a observância do princípio da reserva de jurisdição. Portanto, não se trata de impedir o acesso.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Surge um problema, no tocante à jurisdição, a reserva diz respeito a um objeto, à persecução criminal, e, no caso concreto, o objeto é outro, é a cobrança de tributo.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - Não, mas pode haver até uma disciplina legislativa, uma medida cautelar que permita, porque essa permitiu ao legislador, eventualmente poderia permitir se entendermos.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Mas, aí, contrariaria, porque, quando a Constituição abre exceção à regra, o faz quanto ao Judiciário e para uma finalidade exclusiva, ou seja, a investigação criminal, e não a cobrança de tributo.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - Não me parece, pelo menos não havia entendido assim o voto de Vossa Excelência e, certamente, não dou essa extensão. Eu entendo que a matéria está sujeita a exame - parece-me que aí é razoável -, mas não exigir que sempre haja uma investigação criminal. Não me parece também que fosse essa a posição do Ministro Celso de Mello. Ele enfatizava simplesmente o princípio da reserva de jurisdição, mas não a necessidade de existência de um procedimento de índole criminal. Tanto é que foi isso que me sensibilizou, especialmente no voto de Sua Excelência, quer dizer, é claro que isso onera. E Vossa Excelência, inclusive, sempre ressalta, dizendo que se paga um preço para se viver no estado de Direito ou na democracia, que é a observância de regras mais onerosas.


Portanto, não chego a esse ponto, mas eu vou acompanhar Vossa Excelência quanto ao fundamento básico da necessidade de jurisdição, que também acho que foi a posição defendida pelo Ministro Cezar Peluso, no julgamento, a idéia de reserva de jurisdição.

Portanto, Presidente, eu me manifesto nesse sentido, já com a ressalva, quer dizer, entendo que aqui está presente a necessidade de reserva de jurisdição, mas não a necessidade de que haja uma investigação de índole criminal.


DEBATE


O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - Vossa Excelência, Ministro Gilmar Mendes, só para entender melhor, está exigindo a reserva de jurisdição para acesso aos dados?

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - Para acesso aos dados.

O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - Eu só entendo cabível para interromper uma comunicação.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - Entendendo que isso é uma dimensão mesmo, isso ficou muito claro, inclusive no voto do Ministro Celso de Mello.

O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - Não é nem interromper, é para ouvir, participar de uma interlocução, participar clandestinamente de uma interlocução. Aí, eu exigiria.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Não haveria nem o interesse em interromper, porque o objetivo seria ouvir.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - É. Não, neste caso, são os dados que estão depositados. Não se trata de dados que terão que ser interceptados.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Eu me permitiria - como eu fiz um voto muito singelo, mas na linha do que está sendo colocado pelo eminente Ministro Gilmar Mendes -, quando o § Ia do artigo 145 faz alusão ao respeito aos direitos individuais, isso, a meu ver, indica exatamente que deve ser ouvido o Judiciário. Porque o Judiciário é o guardião último dos direitos fundamentais. Então, o meu voto está exatamente nessa linha.

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: (Cancelado)                                    
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Temos dezesseis mil juizes no Brasil prontos a examinar eventualmente o caso.

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: (Cancelado)

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Ministro, não está em mesa saber a extensão da atuação do Judiciário. Está em jogo definir se a Receita pode ombrear com o Judiciário e afastar o sigilo de dados bancários.  Por isso não me comprometo com  a limitação ao Judiciário.

O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - Mas o sigilo é da comunicação, ou seja, é da interlocução.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - O que não concordo é com a extensão dada ao preceito para se ter, está em bom português a referência a Judiciário, também implicitamente a referência à Receita.


ESCLARECIMENTO

A Senhora Ministra Ellen Gracie - Senhor Presidente, manifestei-me na Ação Cautelar 33, longamente, inclusive sobre o mérito, já que foi um julgamento em que se avançou sobre a matéria de fundo. E, num sentido contrário ao divergente ora manifestado pelo eminente relator, também.eu, assim como o ministro Gilmar Mendes, fui tomada de dúvidas a respeito do tema e, por isso, peço vista.


O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) -Presidente/ tem-se - daí haver inclusive apressado a liberação do processo para julgamento - mandado de segurança. E até aqui existe uma decisão mandamental que, sabemos, surte efeitos imediatos.

Reconheço que o Tribunal cassou - e continuo perplexo com essa cassação - a liminar que implementara. Mas, a esta altura, temos um, dois, três votos a favor do provimento do recurso e três contrários, havendo votos sinalizados do Ministro Celso de Mello e de Vossa Excelência no sentido do provimento do recurso. Por isso, permito-me, sem a menor desconsideração para com a óptica anterior do Colegiado, ante o início do julgamento e para que o recurso extraordinário não perca o objeto - com o cumprimento imediato da decisão do Regional -, propor que o Tribunal, excepcionalmente, implemente uma medida acauteladora para aguardar-se, e não se tornar inócuo o início da apreciação desse recurso extraordinário, a conclusão dessa mesma apreciação.

O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - É que já foi votada a matéria.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE - A matéria foi vencida na Cautelar 33.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) - Eu submeto, mas realmente me parece razoável, porque torna inócua a medida. Se, eventualmente, for concedida, afinal, e a administração já tiver tido acesso aos dados, nossa ordem será absolutamente inócua.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELDSO (PRESIDENTE) - É.

O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - É que já houve uma votação formal, proclamado o resultado.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) - Se a perspectiva for de que o Tribunal denegue o pedido, não vai haver dano.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - O direito de cautela pode ser acionado a qualquer momento. O processo ainda está aberto à apreciação do Colegiado.

O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - Vamos conceder, de ofício.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Que a maioria decida, Presidente!

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE - Essa reversão de decisões no Tribunal está se tornando comum.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) -Como? Perdão, não ouvi.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - É que o Ministro se opôs, dizendo que havia preclusão da matéria. Preclusão não há.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) -Preclusão, não.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Porque a liminar é uma medida sempre precária e efêmera. Pode ser implementada a qualquer momento, como também pode ser reconsiderada.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) - É revogável a qualquer tempo. Claro.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Agora, a questão que coloco é esta: ante o início do julgamento da matéria, com três votos pelo provimento, dois sinalizados, o do Ministro Celso de Mello e o de Vossa Excelência, se não é relevante, para não haver a perda de objeto do recurso extraordinário - repito, estamos nos defrontando com um mandado de segurança com a roupagem do recurso extraordinário -, implementar-se a cautelar, que, por sinal, vigorou por um longo período, já que trouxe o processo, para referendá-la ou não, em 2003.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO:   É  essencial a concessão da tutela cautelar, sob pena de completa frustração  da pretensão  mandamental.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - E ficar a parte sem jurisdição.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE - Bem, a liminar foi concedida em 2003, Ministro Relator?

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Sim.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE - Acredito que esses dados são dados fiscais?

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: Bancários.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE - Mas para efeitos fiscais?

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Sim, trata-se de dados bancários destinados a finalidades de ordem fiscal.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE - Cinco anos são passados, eles já são inúteis.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - Até aqui,penso, não houve o acesso.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) - É que, na semana passada, revogamos a liminar, o que permitiria ao Fisco ter acesso. Noutras palavras, se não concedermos agora uma cautelar, o julgamento será absolutamente inócuo, inútil, frustrante.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - E o acesso não é tão urgente assim.


VOTO S/PROPOSTA


O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: Senhor Presidente, para a concessão da cautelar são necessários dois requisitos: periculum in mora e fumus boni júris. Não vejo plausibilidade jurídica e já votei. Mas, Senhor Presidente, é fato concreto que, em 24 de novembro, o Ministro Gilmar Mendes votou negando referendo à cautelar e, na sessão de hoje, Sua Excelência alterou a posição quanto ao mérito. Nós não podemos desconhecer esse fato.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE - O Ministro Joaquim também esteve presente e também negou.

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: É evidente que discordo do eminente Ministro Relator e dos Ministros que o acompanharam, mas eu não posso tomar para mim a plausibilidade jurídica ou não do caso. A Corte está divida sobre o tema e, portanto, tenho que reconhecer que, mesmo não vendo eu plausibilidade jurídica nenhuma, literalmente nenhuma, eu me curvo, pela necessidade, à proposta do eminente Ministro Marco Aurélio para conceder a cautela, porque talvez só no ano que vem teremos oportunidade de continuar este julgamento.


A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE - Ministro Toffoli, mas a plausibilidade é toda embasada na ausência do meu voto, que na sessão anterior foi em sentido contrário ao do eminente Relator, a ausência eventual do Ministro Joaquim Barbosa e a mudança de posição do Ministro Gilmar Mendes?  

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: Não, não. Até porque, se Vossa Excelência está pedindo vista, é para poder refletir. Se vai refletir, vai refletir talvez a favor do contribuinte.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE - Ou manter a posição, Ministro Toffoli.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) - É que, ante a mudança, no voto do Ministro Gilmar Mendes, o placar ficará invertido, ou pelo menos ficará empatado.

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: (Cancelado)


VOTO S/ PROPOSTA


A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Presidente, acho que, nos termos da lei, é de um mandado de segurança que se trata. O que se exige são dois dados que, naquela ocasião, eu não acolhi, mas que, realmente, na linha do Ministro Dias Toffoli, apenas considero que há relevância jurídica - é o que a lei do mandado de segurança exige - e possibilidade de, se ao final a medida vier a ser concedida, tornar-se ineficaz.

Esses dois elementos que, a meu ver, não existiam quando eu não referendei e votei no sentido do não referendo, hoje, diante do quadro e principalmente diante do tempo decorrido e da possibilidade de haver realmente agora a ineficácia da medida, se ao final ela vier a ser concedida, eu reformulo, portanto, o que entendi para acompanhar a proposta formulada pelo Ministro Relator para este fim, mantendo quanto ao mérito, com a devida vênia, o meu voto.

******

Obs.: Texto sem revisão da Exma. Sra. Ministra Cármen Lúcia. (§ 3e do artigo 96 do RISTF, com a redação dada pela Emenda Regimental nô 26, de 22 de outubro de 2008)


VOTO S/ PROPOSTA


O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - Há risco de prescrição quanto ao tributo ou não?

O   SENHOR   MINISTRO   CEZAR   PELUSO   (PRESIDENTE)   - Pendente de julgamento, não há risco de prescrição nenhum.

O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO - Eu vou permanecer fiel ao voto proferido na última assentada pela não concessão da liminar.


VOTO S/ PROPOSTA


A Senhora Ministra Ellen Gracie - Também eu. Senhor Presidente, não me parece adequado que este Tribunal decida conforme as presenças eventuais na bancada.

Na sessão anterior, estava presente o Ministro Joaquim Barbosa, votou em sentido diverso ao proposto pelo eminente Relator, inclusive é ele o Relator para o acórdão da Ação Cautelar nº 33. Temos hoje colocados os votos que acompanham o eminente Relator: são os Ministros Lewandowski c, em parte, o Ministro Gilmar. Parece-me que o Ministro Gilmar não acompanha Vossa Excelência na integralidade.

O Senhor Ministro Marco Aurélio (Relator) - Não, não acompanha integralmente, porque não está cm discussão a extensão da atuação do Judiciário, Está em jogo apenas a possibilidade de a Receita substituir-se ao Judiciário. Então não há divergência, inclusive quanto ao fundamento. Eu próprio, disse que não me comprometia com a limitação em relação à atividade do Judiciário.

A Senhora Ministra Ellen Gracie - Neste momento do julgamento, mesmo computado o voto do Ministro Gilmar Mendes, nós temos três votos, inclusive o do Relator num sentido; o voto do Ministro Toffoli, da Ministra Cármen Lúcia e do Ministro Ayres Britto, outros três, em sentido contrário. De modo que eu não me sinto confortável para prosseguir, ainda mais diante da ausência de um Colega cuja posição é conhecida; Vossa Excelência sabe muito bem que eu peço vista destes autos apenas para permitir a presença do Colega ao julgamento. Para que o Tribunal não tenha resultados diferentes conforme sua composição eventual.

O  Senhor Ministro Cezar Peluso .(Presidente)  -  Sim, mas temos que tornar aproveitável esse resultado, porque, se não considerarmos o resultado, será inútil.

A Senhora Ministra Ellen Gracie - E, eu ainda levaria em consideração mais um fato,. Presidente. Eventualmente posta a questão da maneira como está, ela, de certa forma, cerceia o meu direito de pedir vista do processo, e diante disso é que manifesto desde logo o meu voto. Se Vossa Excelência assim entender, se encaminhar dessa maneira, eu suspendo o meu pedido de vista. Se for o caso, se eu estiver sendo cerceada no meu direito de pedir vista, eu, desde logo, manifesto o voto.

O Senhor Ministro Cezar Peluso (Presidente) - Quanto ao mérito, Vossa Excelência vai ter toda a oportunidade de se manifestar. O que não teremos nós é a oportunidade de votar depois de inutilizado o remédio!

A Senhora Ministra Ellen Gracie - Esta questão foi decidida na AC 33, Presidente.

O Senhor Ministro Cezar Peluso (Presidente) - Nós é que não vamos ter oportunidade de votar depois, se o remédio se tornar inútil. Isto é, o alcance do seu pedido de vista está garantido em qualquer hipótese, e também dos que pensam em sentido contrário. E, em atendimento a uma velha regra de cortesia em julgamento colegiado, o Ministro Celso e eu não adiantamos voto, que é conhecido, mas só por isso. Agora, se não for concedida a liminar, o seu pedido de vista terá toda a utilidade, mas os nossos votos eventualmente poderão não ter nenhuma.


VOTO


A Senhora Ministra Ellen Gracie - Presidente, se Vossa Excelência me permite, já.que se  encaminha dessa forma a votação, abro mão do meu pedido de vista e desde logo me  manifesto pelo improvimento do recurso extraordinário, exatamente nos mesmos termos em que o fiz na AC n°.33. A questão está para ser decidida com um quorum que me parece inadequado, mas, já que é este o encaminhamento, manifesto meu voto nesse sentido, com
vênia do eminente Relator      
                                       ´

VOTO


O  SENHOR  MINISTRO  CELSO  DE  MELLO:  A  controvérsia instaurada na presente causa suscita algumas reflexões em torno do tema pertinente ao alcance da norma inscrita no art. 5S, X e XII, da Constituição, que, ao consagrara tutela jurídica da intimidade (e, também, da privacidade), dispõe que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (...)" (grifei).

Esse tema ganha ainda maior relevo, se se considerar o círculo de proteção que o ordenamento constitucional estabeleceu em torno das pessoas, notadamente dos contribuintes do Fisco, objetivando protegê-los contra ações eventualmente arbitrárias praticadas pelos órgãos estatais da administração tributária, o que confere especial importância ao postulado da proteção judicial efetiva, que torna inafastável, em situações como a dos autos, a necessidade de autorização judicial, cabendo ao Juiz, e não a administração tributária, a quebra do sigilo bancário.

É que os órgãos estatais da administração tributária não guardam, em relação ao contribuinte, posição de eqüidistância nem dispõem do atributo (apenas inerente à jurisdição) da "terzietà", o que põe em destaque o sentido tutelar da cláusula inscrita no § 1º do art. 145 de nossa Lei Fundamental.

Com efeito, a própria Constituição da República, em seu art. 145, § 1º, ao dispor sobre o sistema tributário nacional, prescreve, em caráter impositivo, que a administração tributária, quando no exercício de sua competência, respeite os direitos individuais das pessoas em geral e dos contribuintes em particular.

O exame da questão ora em análise torna indispensável que se aprecie, já nesta fase, o tema concernente ao poder do Estado e às relações entre o Fisco, os contribuintes e os cidadãos em geral.

Impende reconhecer, desde logo, que não são absolutos - mesmo porque não o são - os poderes de que se acham investidos os órgãos e agentes da administração tributária, cabendo assinalar, por relevante, Senhores Ministros, presente o contexto ora em exame, que o Estado, em tema de tributação, está sujeito à observância de um complexo de direitos e prerrogativas que assistem, constitucionalmente, aos contribuintes e aos cidadãos em geral. Na realidade, os poderes do Estado encontram, nos direitos e garantias individuais,   limites  intransponíveis,   cujo  desrespeito  pode caracterizar ilícito constitucional.

Daí a necessidade de rememorar, sempre, a função tutelar do Poder Judiciário, investido de competência institucional para neutralizar eventuais abusos das entidades governamentais, que, muitas vezes deslembrada da existência, em nosso sistema jurídico, de um verdadeiro "estatuto constitucional do contribuinte" consubstanciador de direitos e limitações oponíveis ao poder impositivo do Estado (Pet 1.466/PB, Rel. Min. CELSO DE MELLO, ´in" Informativo/STF nº 125) - culminam por asfixiar, arbitrariamente, o sujeito passivo da obrigação tributária, inviabilizando-lhe, injustamente, trate-se de obrigação tributária principal, cuide-se de obrigação tributária acessória ou instrumental, a prática de garantias legais e constitucionais de que é legítimo titular, fazendo instaurar, assim, situação que só faz conferir permanente atualidade ao "dictum" do Justice Oliver Wendell Holmes, Jr. ("The power to tax is not the power to destroy while this Court sits"), em palavras segundo as quais, em livre tradução, "o poder de tributar não significa nem envolve o poder de destruir, pelo menos enquanto existir esta Corte Suprema", proferidas, ainda que como "dissenting opinion", no julgamento, em 1928, do caso "Panhandle Oil Co. v. State of Mississippi Ex Rei. Knox" (277 U.S.. 218).

O que me parece significativo, no contexto ora em exame, é que a administração tributária, embora podendo muito, não pode tudo, eis que lhe é somente lícito atuar, "respeitadosos direitos individuais e nos termos da lei" (CF, art. 145, § 1º), consideradas, sob tal perspectiva, e para esse efeito, as limitações decorrentes do próprio sistema constitucional, cuja eficácia restringe, como natural conseqüência da supremacia de que se acham impregnadas as garantias instituídas pela Lei Fundamental, o alcance do poder estatal, especialmente quando exercido em face do contribuinte e dos cidadãos da República.

Cumpre ter presente, neste ponto, Senhores Ministros, a propósito do tema ora em exame, a advertência do Supremo Tribunal Federal, cujo magistério jurisprudencial - apoiando-se em autorizado entendimento doutrinário (HUGO DE BRITO MACHADO SEGUNDO, "Processo Tributário", p. 76/86, item n. 2.5.2, 2004, Atlas; SACHA CALMON NAVARRO COELHO, "Curso de Direito Tributário Brasileiro", p. 893/907, itens ns. 17.12 a 17.20, 8ª ed. , 2005, Forense; HUGO DE BRITO MACHADO, "Curso de Direito Tributário", p. 214/223, itens ns. 1 a 1.6, 21» ed., 2002, Malheiros; ROQUE ANTÔNIO CARRAZZA, "Curso de Direito Constitucional Tributário", p. 404/411, item n. 3, 21a ed., 2005, Malheiros, v.g.) - orienta-se no sentido de preservar o contribuinte contra medidas arbitrárias adotadas pelos agentes da administração tributária, muitas das quais configuram atos eivados de ilicitude, quando não de transgressão à ordem jurídica fundada na própria Constituição da República (RTJ 162/3-6, 4, Rei. Min. ILMAR GALVÃO - RTJ 185/237-238, Rei. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE -RE 331.303-AgR/PR, Rei. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, v.g.).

Na realidade, a circunstância de a administração estatal achar-se investida de poderes excepcionais que lhe permitem exercer a fiscalização em sede tributária não a exonera do dever de observar, para efeito do correto desempenho de tais prerrogativas, os limites impostos pela Constituição e pelas leis da República, sob pena de os órgãos governamentais incidirem em frontal desrespeito às garantias constitucionalmente asseguradas aos cidadãos em geral e aos contribuintes, em particular.

O procedimento estatal da administração tributária que contrarie os postulados consagrados pela Constituição da República revela-se inaceitável, Senhores Ministros, e não pode ser corroborado por decisão desta Suprema Corte, sob pena de inadmissível subversão dos postulados constitucionais que definem, de modo estrito, os limites - inultrapassáveis - que restringem os poderes do Estado em suas relações com os contribuintes e com terceiros,  tal  como  advertiu  o  Supremo  Tribunal  Federal  em julgamento consubstanciado em acórdão assim ementado:


" ADMINISTRAÇÃO   TRIBUTÁRIA   -   FISCALIZAÇÃO PODERES - NECESSÁRIO RESPEITO AOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS DOS CONTRIBUINTES E DE TERCEIROS.

Não são absolutos os poderes de que se acham investidos  os  órgãos  e  agentes  da  administração tributária, pois o Estado,  em tema de tributação, inclusive em matéria de fiscalização tributária, está sujeito à observância de um complexo de direitos e prerrogativas que assistem,  constitucionalmente,  aos contribuintes e aos cidadãos em geral. Na realidade, os poderes do Estado encontram, nos direitos e garantias individuais, limites intransponíveis, cujo desrespeito pode caracterizar ilícito constitucional. A administração tributária,  por isso mesmo, embora podendo muito, não pode tudo. É que, ao Estado, é  somente  lícito  atuar,  ´ respeitados  os  direitos individuais e nos termos da lei´ (CF, art. 145, § 1º), consideradas, sobretudo, e para esse específico efeito, as limitações jurídicas decorrentes do próprio sistema instituído pela  Lei  Fundamental,  cuja  eficácia que prepondera  sobre  todos  os  órgãos  e  agentes fazendários - restringe-lhes o alcance do poder de que se acham investidos,especialmente quando exercido em face do contribuinte e dos cidadãos da República, que são titulares de garantias impregnadas de estatura constitucional e que, por tal razão, não podem ser transgredidas por aqueles que exercem a autoridade em nome do Estado. (...)." (HC 93.050/RJ, Rei. Min. CELSO DE MELLO).

Posta a questão nesses termos, mostra-se imperioso assinalar, considerados os fatos subjacentes ao litígio em causa, que se revela inacolhível a pretensão da administração tributária federal,   que   busca   afastar,   "ex  própria   auctoritate", independentemente de prévia autorização judicial, o sigilo bancário da empresa contribuinte, ora recorrente.

Não se pode ignorar que o direito à intimidade (e, também, à privacidade) - que representa importante manifestação dos direitos da personalidade - qualifica-se como expressiva prerrogativa de ordem jurídica que consiste em reconhecer, em favor da pessoa, a existência de um espaço indevassável destinado a protegê-la contra indevidas interferências de terceiros na esfera de sua vida privada.

Daí a correta advertência feita por CARLOS ALBERTO Dl FRANCO, para quem "Um dos grandes desafios da sociedade moderna é a preservação do direito à intimidade. Nenhum homem pode ser considerado verdadeiramente livre, se não dispuser de garantia de inviolabilidade da esfera de privacidade que o cerca".

Por isso mesmo, a transposição arbitrária, para o domínio publico, de questões meramente pessoais, sem qualquer reflexo no plano dos interesses sociais, tem o significado de grave transgressão ao postulado constitucional que protege o direito à intimidade e à privacidade (MS 23.669-MC/DF, Rei. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), pois este, na abrangência de seu alcance, representa o "direito de excluir, do conhecimento de terceiros, aquilo que diz respeito ao modo de ser da vida privada" (HANNAH ARENDT).

É certo que a garantia constitucional da intimidade (e da privacidade) não tem caráter absoluto. Na realidade, como já decidiu esta Suprema Corte, "Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição" (MS 23.452/RJ, Rei. Min. CELSO de MELLO). Isso não significa, contudo, que o estatuto constitucionaldas liberdades públicas - nele compreendida a garantia fundamental da intimidade e da privacidade - possa ser arbitrariamente desrespeitado por qualquer órgão do Poder Público.

Nesse contexto, põe-se em evidência a questão pertinente ao sigilo bancário, que, ao dar expressão concreta a uma das dimensões em que se projeta, especificamente, a garantia
constitucional da privacidade, protege a esfera de intimidade financeira das pessoas.                            :

Embora o sigilo bancário, também ele, não tenha caráter absoluto (RTJ 148/366, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - RTJ 172/302-303, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - MS 23.452/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.) , deixando de prevalecer, por isso mesmo, em casos excepcionais, diante de exigências impostas pelo interesse público (SÉRGIO CARLOS COVELLO, "O Sigilo Bancário como Proteção à Intimidade", "in" Revista dos Tribunais, vol. 648/27), não se pode desconsiderar, no exame dessa questão, que o sigilo bancário reflete uma expressiva projeção da garantia fundamental da privacidade - e da intimidade financeira das pessoas, em particular -, não se expondo, em conseqüência, enquanto valor constitucional que é (VÂNIA SICILIANO AIETA, "A Garantia da Intimidade como Direito Fundamental", p. 143/147, 1999, Lumen Júris), a intervenções estatais ou a intrusões do Poder Público desvestidas de causa provável ou destituídas de base jurídica idônea.

Tenho insistentemente salientado, em decisões várias que já proferi nesta Suprema Corte,  que a tutela jurídica da intimidade (e, também, da privacidade) constitui - qualquer que seja a dimensão em que se projete - uma das expressões mais significativas em que se pluralizam os direitos da personalidade. Trata-se de valor constitucionalmente assegurado (CF, art. 5º, X),
cuja proteção normativa busca erigir e reservar, sempre em favor do indivíduo - e contra a ação expansiva do arbítrio do Poder Público -uma esfera de autonomia intangível e indevassável pela atividade desenvolvida pelo aparelho de Estado.

O magistério doutrinário, bem por isso, tem acentuado que o  sigilo bancário  - que possui  extração constitucional reflete,  na concreção do seu alcance, um direito fundamental da personalidade, expondo-se, em conseqüência, à proteção jurídica a ele dispensada pelo ordenamento positivo do Estado.

O eminente Professor ARNOLDO WALD, em precisa abordagem do  tema  ("Caderno de Direito Tributário  e  Finanças  Publicas", vol. 1/206, 1992, RT) , expendeulúcidas considerações a respeito dessa questão, destacando a essencialidade da tutela constitucional na proteção político-jurídica da intimidade pessoal e da liberdade individual:

"Se podia haver dúvidas no passado, quando as Constituições brasileiras não se referiam especificamente à proteção da intimidade, da vida privada e do sigilo referente aos dados pessoais, é evidente que, diante do texto constitucionalde 1988, tais dúvidas não mais existem quanto à proteção do sigilo bancário como decorrência das normas da lei magna.

Efetivamente, as Constituições Brasileiras anteriores à de 1988, não só não asseguravam o direito â privacidade como também, guando tratavam do sigilo, limitavam-se a garanti-lo em relação à correspondência e às comunicações telegráficas e telefônicas, não se referindo ao sigilo em relação aos papéis de que tratam a Emenda nº IV à Constituição Americana, a Constituição Argentina e leis fundamentais de outros países.

Ora, foi em virtude da referência aos papéis que tanto o direito norte-americano quanto o argentino concluíram que os documentos bancários tinham proteção constitucional.

Com a revolução tecnológica, os ´papéis´ se transformaram em ´dados´ geralmente armazenados em computadores ou fluindo através de impulsos eletrônicos, ensejando enormes conjuntos de informações a respeito das pessoas, numa época em que todos reconhecem que a informação é poder. A computadorização da sociedade exigiu uma maior proteção à privacidade, sob pena de colocar o indivíduo sob contínua fiscalização do Governo, inclusive nos assuntos que são do exclusivo interesse da pessoa. Em diversos países, leis especiais de proteção contra o uso indevido de dados foram promulgadas e, no Brasil, a inviolabilidade dos dados individuais, qualquer que seja a sua origem, forma e finalidade, passou a merecer a proteção constitucional em virtude da referência expressa que a eles passou a fazer o inciso XII do art. 5º, modificando, assim, a posição anterior da nossa legislação, na qual a indevassabilidade em relação a tais informações devia ser construída com base nos princípios gerais que asseguravam a liberdade individual, podendo até ensejar interpretações divergentes ou contraditórias.

Assim, agora em virtude dos textos expressos da Constituição e especialmente da interpretação sistemática dos incisos X e XII do art. 5º  da CF, ficou evidente que a proteção ao sigilo bancário adquiriu nível constitucional, impondo-se ao legislador, o que, no passado, podia ser menos evidente." (grifei)

O direito à inviolabilidade dessa franquia individual -que  constitui,  insista-se,  um dos núcleos básicos  em que  se desenvolve,  em nosso País,  o -regime das liberdades públicas
ostenta, como precedentemente enfatizado, caráter meramente relativo. Não assume nem se reveste de natureza absoluta. Cede, por isso mesmo, e sempre em caráter excepcional, às exigências impostas pela preponderância axiológica e jurídico-social do interesse público, tal como acentuado, em diversos julgamentos, por esta Suprema Corte (AI 528.539/PR, Rel. Min. CEZAR PELUSO - AI 655.298--AgU/SP, Rel. Min. EROS GRAU, v.g.):

-CONSTITUCIONAL.     SIGILO    BANCÁRIO:     QUEBRA. ADMINISTRADORA DE CARTÕES DE CRÉDITO. CF, art. 5º, X.
I - Se é certo que o sigilo bancário, que é espécie de direito à privacidade, que a Constituição protege - art. 5", X -, não é um direito absoluto, Que deve ceder diante do interesse público, do interesse social e do interesse da Justiça, certo é, também, que ele há de ceder na forma e com observância de procedimento estabelecido em lei e com respeito ao princípio da razoabilidade. (...)."
RE 219.780/PE, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - grifei)

A pesquisa da verdade, nesse contexto, constitui um dos princípios dominantes e fundamentais no processo de "disclosure" das operações celebradas no âmbito das instituições financeiras. Essa busca de elementos informativos - elementos estes que compõem o quadro de dados probatórios essenciais para que o Estado desenvolva regularmente_suas atividades e realize os fins institucionais a que se acha vinculado -, sofre os necessários condicionamentos que a ordem jurídica impõe à ação do Poder Público.

Tenho enfatizado, por isso mesmo, que a quebra do sigilo bancário - ato que se reveste de extrema gravidade jurídica - deve ser decretada, e sempre em caráter de absoluta excepcionalidade, quando existentes fundados elementos que justifiquem, a partir de um critério essencialmente apoiado na prevalência do interesse público, a necessidade da revelação dos dados pertinentes às operações financeiras ativas e passivas resultantes da atividade desenvolvida pelas instituições bancárias.

A relevância do direito ao sigilo bancário impõe, por isso mesmo, cautela e prudência ao Poder Judiciário na determinação da ruptura da esfera de privacidade individual que o ordenamento jurídico, em norma de salvaguarda, pretendeu submeter à cláusula tutelar de reserva constitucional (CF, art. 5°, X).

É preciso salientar, neste ponto, que a jurisprudência do  Supremo  Tribunal  Federal  proclamou  a  plena  compatibilidade jurídica da quebra do sigilo bancário com a norma inscrita no art. 52, incisos X e XII, da Constituição (Pet 577-QO/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, DJtJ de 23/04/93), reconhecendo possível autorizar - quando presentes fundadas razões - a pretendida "disclosure" das informações bancárias reservadas (RTJ 148/366).

Mais do que isso, esta Suprema Corte salientou, ao julgar o Inq 897-AgR/DF, Rel. Min. FRANCISCO REZEK, DJU de 02/12/94, que, não sendo absoluta a garantia pertinente ao sigilo bancário, torna-se licito afastar, quando de investigação criminal se cuidar, p. ex. , a cláusula de reserva que protege as contas bancárias nas instituições financeiras, revelando-se ordinariamente inaplicável, para esse específico efeito, a garantia constitucional do contraditório.

Impõe-se observar, por necessário - e tal como adverte JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE ("Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976", p. 220/224, 1987, Livraria Almedina, Coimbra) - que a ampliação da esfera de incidência das franquias individuais e coletivas, de um lado, e a intensificação da proteção jurídica dispensada às liberdades fundamentais, de outro, tornaram inevitável a ocorrência de situações caracterizadoras de colisão de direitos assegurados pelo ordenamento constitucional.

Com a evolução do sistema de tutela constitucional das liberdades públicas, dilataram-se os espaços de conflito em cujo âmbito antagonizam-se, em função de situações concretas emergentes, posições  jurídicas  revestidas  de  igual  carga  de  positividade normativa.

Vários podem ser, dentro desse contexto excepcional de conflituosidade, os critérios hermenêuticos destinados à solução das colisões de direitos, que vãodesde o estabelecimento de uma ordem hierárquica pertinente aos valores constitucionais tutelados, passando pelo reconhecimento do maior ou menor grau de fundamentalidade dos bens jurídicos em posição de antagonismo, até a consagração de um processo que, pri vi 1 egi ando a_ unidade  supremacia da Constituição, viabilize - a partir da adoção "de um critério de proporcionalidade na distribuição dos custos do conflito" (JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, "op. loc. cit.") - a harmoniosa composição dos direitos em situação de colidência.

Sendo assim, impõe-se o deferimento da quebra de sigilo bancário, sempre que essa medida se qualificar como providência essencial e indispensável à satisfação das finalidades inderrogáveis da investigação (e/ou da fiscalização) estatal, e desde que -consoante adverte a doutrina - não exista "nenhum meio menos gravoso para a consecução de tais objetivos" (IVES GANDRA MARTINS/GILMAR FERREIRA MENDES, "Sigilo Bancário, Direito de Autodeterminação sobre Informações e Princípio da Proporcionalidade", "in" Repertório IOB de Jurisprudência n2 24/92 - 2a quinzena de dezembro/92).

Contudo, para que essa providência extraordinária, e sempre excepcional, que é a decretação da quebra do sigilo bancário, seja autorizada, revela-se imprescindível a existência de causa provável, vale dizer, de fundada suspeita quanto à ocorrência de fato cuja apuração resulte exigida pelo interesse público.

Na realidade, sem causa provável, não se justifica, sob pena de inadmissível consagração do arbítrio estatal e_ de inaceitável opressão do indivíduo pelo Poder Público, a "disclosure" das contas bancárias, eis que a decretação da quebra do sigilo não pode converter-se num instrumento de indiscriminada e ordinária devassa da vida financeira das pessoas em geral.

A quebra do sigilo bancário importa, necessariamente,
em inquestionável restrição à esfera jurídica das pessoas afetadas por esse ato excepcional do Poder Público. A pretensão estatal voltada à "disclosure" das operações financeiras constitui fator de grave ruptura das delicadas relações - ja estruturalmente tão desiguais - existentes entre o Estado e o indivíduo, tornando possível, até mesmo, quando indevidamente acolhida, o próprio comprometimento do sentido tutelar que inequivocamente qualifica, em seus aspectos essenciais, o círculo de proteção estabelecido em torno da prerrogativa pessoal fundada no direito constitucional à privacidade.

Dentro dessa perspectiva, revela-se de inteira pertinência a invocação doutrinária da cláusula do "substantive ãue process of law" - já consagrada e reconhecida, em diversas decisões proferidas por este Supremo Tribunal Federal, como instrumento de
expressiva limitação constitucional ao próprio poder do Estado (ADI 1.063/DF, Rei. Min. CELSO DE MELLO - ADI 1.158/AM, Rei. Min. CELSO DE MELLO, v.g.) -, para efeito de submeter o processo de "disclosure" às exigências de seriedade e de razoabilidade.

Daí o registro feito por ARNOLDO WALD (,"op. cit.", p. 207, 1992, RT), no sentido de que "A mais recente doutrina norte-americana fez do ´due process of law´ uma forma de controle constitucional que examina a necessidade, razoabilidade e justificação das restrições à liberdade individual, não admitindo que a lei ordinária desrespeite a Constituição, considerando que as restrições ou exceções estabelecidas pelo legislador ordinário devem ter uma fundamentação razoável e aceitável conforme entendimento do Poder Judiciário. Coube ao Juiz Rutledge, no caso Thomas v. Collins, definir adequadamente a função do devido processo legal ao afirmar que: ´Mais uma vez temos de enfrentar o dever, imposto a esta Corte,pelo nosso sistema constitucional, de dizer onde termina a liberdade individual e onde começa o poder do Estado. A escolha do limite, sempre delicada, é-o, ainda mais, quando a presunção usual em favor da lei é contrabalançada pela posição preferencial atribuída, em nosso esquema constitucional, às grandes e indispensáveis liberdades democráticas asseguradas pela Primeira Emenda (...). Esta prioridade confere a essas liberdades santidade e sanção que não permitem intromissões dúbias. E é o caráter do direito, não da limitação, que determina o standard guiador da escolha. Por essas razões, qualquer tentativa de restringir estas liberdades deve ser justificada por evidente interesse público, ameaçado não por um perigo duvidoso e remoto, mas por um perigo evidente e atual´" (grifei).

À exigência  de  preservação  do  sigilo  bancário enquanto meio expressivo de proteção ao valor constitucional da intimidade - impõe ao Estado o dever de respeitar a esfera jurídica de cada pessoa. A ruptura desse círculo de imunidade só se justificará desde que ordenada por órgão estatal investido, nos termos de nosso estatuto constitucional, de competência jurídica para suspender, excepcional e motivadamente, a eficácia do princípio da reserva das informações bancárias.

Em tema de ruptura do sigilo bancário, somente os órgãos do Poder Judiciário dispõem do poder de decretar essa medida extraordinária, sob pena de a autoridade administrativa interferir, indevidamente, na esfera de privacidade constitucionalmente assegurada às pessoas. Apenas o Judiciário, ressalvada a competência das Comissões Parlamentares de Inquérito (CF, art. 58, § 3º), pode eximir as instituições financeiras do dever que lhes incumbe em tema de sigilo bancário.

Daí a correta decisão emanada do E. Superior Tribunal de Justiça, que, em julgamento sobre o tema ora em análise, assim apreciou a questão pertinente à indispensabilidade de prévia autorização judicial para efeito de quebra do sigilo bancário:

" SIGILO  BANCÁRIO  -  INSTITUIÇÕES  FINANCEIRAS AUTORIZAÇÃO JUDICIAL.
O sigilo bancário do contribuinte não pode ser quebrado com base em procedimento administrativo-- fiscal, por implicar indevida intromissão na privacidade do cidadão, garantia esta expressamente amparada pela Constituição Federal (artigo 5º, inciso X).
Por isso, cumpre às instituições financeiras manter sigilo acerca de qualquer informação ou documentação pertinente à movimentação ativa e passiva do correntísta/contribuinte, bem como dos serviços bancários a ele prestados.
Observadas tais vedações, cabe-lhes atender às demais solicitações de informações encaminhadas pelo Fisco, desde que decorrentes de procedimento fiscal regularmente instaurado e subscritas por autoridade administrativa competente.

Apenas o Poder Judiciário, por um de seus órgãos, pode eximir as instituições financeiras do dever de segredo em relação às matérias arroladas em lei.
(...)
(RDA 197/174, Rel. Min. DEMÓCRITO REINALDO - grifei)

A efetividade da ordem jurídica, a eficácia da atuação do aparelho estatal e a reação social a comportamentos qualificados pela nota de seu desvalor ético-jurídico não ficarão comprometidas nem afetadas,se se reconhecer aos órgãos do Poder Judiciário, com fundamento e apoio nos estritos limites de sua competência institucional, a prerrogativa de ordenar a quebra do sigilo bancário. Na realidade, a intervenção jurisdicional constitui fator de preservação do regime das franquias individuais e impede, pela atuação moderadora do Poder Judiciário, que se rompa, injustamente, a esfera de privacidade das pessoas, pois a quebra do sigilo bancário não pode nem deve ser utilizada, ausente a concreta indicação de uma causa provável, como instrumento de devassa indiscriminada das contas mantidas em instituições financeiras.

A tutela do valor pertinente ao sigilo bancário não significa qualquer restrição ao poder de investigar e/ou de fiscalizar do Estado, eis que o Ministério Público, as corporações policiais e os órgãos incumbidos da administração tributária e previdenciária do Poder Público sempre poderão requerer aos juizes e Tribunais que ordenem às instituições financeiras o fornecimento das informações reputadas essenciais à apuração dos fatos.

Impõe-se destacar,  neste ponto,  que nenhum embaraço resultará do controle judicial prévio dos pedidos de decretação da quebra de sigilo bancário, pois, consoante já proclamado pelo Supremo Tribunal Federal, não sendo absoluta a garantia pertinente ao sigilo bancário, torna-se licito afastar, em favor do interesse público, a cláusula de reserva que protege as contas bancárias nas instituições financeiras.

Não configura demasia insistir, Senhor Presidente, na circunstância - que assume indiscutível relevo jurídico - de que a natureza eminentemente constitucional do direito à privacidade impõe, no sistema normativo consagrado pelo texto da Constituição da República, a necessidade de intervenção jurisdicional no processo de revelação de dados ("disclosure") pertinentes às operações financeiras, ativas e passivas, de qualquer pessoa eventualmente sujeita à ação investigatória (ou fiscalizadora) do Poder Público.

A inviolabilidade do sigilo de dados, tal como proclamada pela Carta Política em seu art. 5º, XII, torna essencial que as exceções derrogatórias à prevalência desse postulado só possam emanar de órgãos estatais - os órgãos do Poder Judiciário (e, excepcionalmente, as Comissões Parlamentares de Inquérito) -, aos quais a própria Constituição Federal outorgou essa especial prerrogativa de ordem jurídica.

A equaçãodireito ao sigilo - dever de sigilo exige -para que se preserve a necessária relação de harmonia entre uma expressão essencial dos direitos fundamentais reconhecidos em favor da generalidade das pessoas (verdadeira liberdade negativa, que impõe, ao Estado, um claro dever de abstenção) , de um lado, e a prerrogativa que inquestionavelmente assiste ao Poder Público de investigar comportamentos de transgressão à ordem jurídica, de outro - que a determinação de quebra do sigilo bancário provenha de ato emanado de órgão do Poder Judiciário, cuja intervenção moderadora na resolução dos litígios, insista-se, revela-se garantia de respeito tanto ao regime das liberdades públicas quanto à supremacia do interesse público.

Sendo assim, Senhor Presidente, e tendo em consideração as razões expostas, entendo que a decretação da quebra do sigilo bancário, ressalvada a competência extraordinária das CPIs (CF, art. 58, § 3º), pressupõe,sempre, a existência de ordem judicial, sem o que não se imporá à instituição  financeira o dever de fornecer, seja à administração tributária, seja ao Ministério Público, seja, ainda, à Polícia Judiciária, as informações que lhe tenham sido solicitadas.
Desse modo, Senhor Presidente, e em face das razões expostas, peço vênia para acompanhar o douto voto proferido pelo eminente Ministro MARCO AURÉLIO, Relator da presente causa.
E o meu voto.


VOTO


O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) - Eu também vou pedir vênia à divergência para dar provimento ao recurso.
Não me parece caso de reeditar os amplos argumentos já brilhante e exaustivamente deduzidos, só lembrando que a postura adotada em nada prejudica a administração pública, que pode, fundamentadamente, requerer ao Poder Judiciário, que lhe franqueará acesso aos dados de que precise.


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