segunda-feira, 12 de julho de 2010

Gargalo chega ao setor de carga aérea

Gargalo chega ao setor de carga aérea

Problemas, como a falta de áreas de armazenagem, expõem a fragilidade do transporte aéreo no País e já preocupam indústria nacional

Depois do estrangulamento do setor portuário, agora é a vez de os aeroportos sentirem os efeitos da falta de infraestrutura para o transporte de cargas. Os problemas são iguais aos dos portos: faltam áreas de armazenagem, instalações (câmaras refrigeradas) para produtos especiais e mão de obra suficiente para liberar as mercadorias dentro de padrões internacionais.

O resultado tem sido a ampliação do tempo de desembaraço dos produtos importados. Há casos em que a mercadoria demora mais para ser liberada em território nacional do que para sair do país de origem, como a China, e chegar ao Brasil. "Esse problema prejudica não só o transporte aéreo, mas também a indústria, que perde velocidade na produção", afirma Allemander Pereira, consultor do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea).

Representantes do setor industrial temem que o problema se agrave ainda mais neste semestre, quando é esperado um aumento nas importações para atender ao Dia da Criança e ao Natal. A luz amarela já acendeu em aeroportos como os de Guarulhos e Viracopos, em São Paulo, Confins, em Belo Horizonte, Salvador e Manaus.

Os primeiros sinais de estrangulamento surgiram em 2008, antes da crise mundial. Na época, alguns terminais já estavam operando acima da capacidade, conforme estudo feito pela McKinsey&Company, a pedido do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O trabalho mostrou que, na área de importação, Viracopos trabalhava com 140% da capacidade. Em exportação, Confins atingiu 130% e Salvador, 113%. Guarulhos estava em nível bastante elevado, de 84% (importação) e 78% (exportação).

Com o arrefecimento da economia, os aeroportos passaram bem pelo ano de 2009. Mas o alívio durou pouco. Desde o início do ano, o volume de importações, que cresceu 41,5% até maio, tornou visível a fragilidade do transporte aéreo.

Em Manaus, onde está localizado um dos maiores polos industriais do País, o problema chegou ao limite, diz o presidente do Sindicato das Indústrias de Aparelhos Elétricos, Eletrônicos e Similares de Manaus, Wilson Périco. Sem área suficiente para atender ao volume crescente, as mercadorias ficaram armazenadas no pátio, cobertas apenas por lonas. Para piorar, o número de pessoas para registrar e liberar os produtos não foi suficiente. "As cargas demoraram até 18 dias para serem liberadas", afirma Périco. Segundo ele, a estimativa é que as empresas tiveram prejuízo de US$ 650 milhões entre fevereiro e maio.

Périco afirma que o problema foi agravado pela Copa do Mundo, que ampliou a produção de TVs. "Mas teremos problemas a partir de setembro, se a Infraero (que administra os aeroportos) não fizer investimento em um terminal de cargas." A Infraero não respondeu ao pedido de entrevista da reportagem.

 

Faltam áreas para construir terminais

Diretor da TAM reclama da falta de espaço para novos investimentos em aeroportos

Um dos grandes problemas dos principais aeroportos do País é a restrição de áreas para construir novos terminais de carga. É o que ocorre em Guarulhos e em Brasília, afirma o vice-presidente Comercial e de Planejamento da TAM, Paulo Castello Branco. Ele explica que a empresa tenta há algum tempo construir um grande terminal em Guarulhos ? local que ele considera já estar estrangulado ?, mas está impedido por falta de espaço.

"Preciso de duas áreas e só consegui uma. Estamos dispostos a investir na infraestrutura, mas precisamos ter condições", lamenta o executivo. Ele comenta que a mesma situação ocorre no aeroporto de Brasília, hub (principal centro de operação) da TAM no País. É a partir dali que a empresa faz toda a distribuição da carga. "Faltam áreas cobertas para abrigar as mercadorias. Falta espaço para operacionalizar a carga. Tudo isso reduz a nossa agilidade para escoar a carga", explica.

Em Guarulhos, aeroporto que concentra 54% de toda carga aérea movimentada no País, a situação é muito parecida, afirma o presidente do Sindicato dos Despachantes Aduaneiros de São Paulo, Valdir Santos. Além de áreas de armazenagem, faltam câmaras refrigeradas para acomodar produtos perecíveis, vacinas e medicamentos. Embora o aeroporto conte com duas "geladeiras", elas não têm dado conta da demanda, conta Santos. "Algumas empresas estão perdendo mercadorias porque ficam fora da geladeira."

Outro problema é o fato de existir, dentro dessa câmara refrigerada, muita carga estragada, que não pode ser incinerada no local por causa da legislação ambiental. "Tem de tirar dali e levar para outro lugar. É uma burocracia grande. Enquanto isso, não há espaço para colocarmos mercadoria nova", lamenta Santos.

Roubo. O presidente da Associação das Empresas Comissárias e Agentes de Carga de Minas Gerais (Codaca), Roger Rohlfs, conta que tem evitado fazer qualquer operação por Guarulhos por causa do risco de roubo da carga. "Prefiro gastar mais tempo e dinheiro e trazer algumas mercadorias por Confins. O gargalo já está instalado em Guarulhos", diz ele.

Santos também alerta para os problemas que podem surgir no segundo semestre. Em maio, por exemplo, Viracopos, em Campinas (SP), segundo maior em cargas, já bateu recorde de movimentação. "O que era para ocorrer no segundo semestre ocorreu no primeiro. Será um caos nos próximos meses." Só no ano passado, o aeroporto movimentou cerca de 189,7 mil toneladas de produtos. Com importações, o uso da capacidade desse terminal chegou a 140% ao longo de 2009.

A falta de infraestrutura também virou incômodo para a indústria de Goiás. Na capital, Goiânia, o Aeroporto Santa Genoveva costuma armazenar os produtos no pátio, em barracas de lonas, diz o presidente do Sindicato da Indústria da Construção de Goiás, Roberto Elias.

Para ele, o setor é um dos grandes gargalos do Estado e atrapalha bastante o polo farmoquímico da região, o terceiro maior do País. "Chega a ser pior do que a nossa logística rodoviária", analisa Elias.

 

(aspas)

Por : por Renée Pereira, para o Jornal “O Estado de S.Paulo”, 05/07/2010

Nenhum comentário: