sexta-feira, 6 de março de 2009

NOVO REGULAMENTO ADUANEIRO – UNIDADES DE CARGA (CONTÊINERES)

HAROLDO GUEIROS e JOSÉ GERALDO REIS
 

Aleluia! Finalmente o Regulamento Aduaneiro resolveu reconhecer, no art. 39, o que diz a lei, ou seja, que a entrada no território nacional da unidade de carga (container) é LIVRE. No regulamento anterior (art. 38) dizia que tais unidades eram sujeitas a controle desde a entrada até a saída, quando a mesma lei diz que eles podem não sair e ser utilizados livremente no país no transporte de mercadorias.

Eis o que diz o NOVO REGULAMENTO ADUANEIRO:

Das Unidades de Carga

Art. 39.  É livre, no País, a entrada e a saída de unidades de carga e seus acessórios e equipamentos, de qualquer nacionalidade, bem como a sua utilização no transporte doméstico (Lei no 9.611, de 19 de fevereiro de 1998, art. 26).

§ 1o  Aplica-se automaticamente o regime de admissão temporária ou de exportação temporária aos bens referidos no caput.

§ 2o  Poderá ser exigida a prestação de informações para fins de controle aduaneiro sobre os bens referidos no caput, nos termos estabelecidos em ato normativo da Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Temos nos ocupado com este tema, principalmente com o conceito do que seja LIVRE. Livre do que? Uma certeza temos: é livre do despacho aduaneiro. A Receita tangenciou essa liberdade ao dar ao container um despacho aduaneiro, ainda que automático, de admissão temporária. Ora, se é LIVRE a entrada do container no país, por que submetê-lo ao regime de admissão temporária, ainda que automática?

Outra certeza temos: se é livre não há que se falar em fato gerador do imposto de importação. Na admissão temporária ocorre o fato gerador e seu pagamento é suspenso, até que o bem retorne ao exterior. No caso peculiar do container ele não precisa voltar ao exterior, eis que a lei lhe permite ser utilizado no país no “transporte doméstico”. Se não há fato gerador, muito menos poderia haver qualquer regime, ainda que especial, como foi o caso.

Nesta oportunidade desejamos fazer uma comparação um tanto grosseira do container com o “software”. Ambos tem entrada LIVRE no território nacional, porque tanto o software como o container não são mercadoria.

A sustentar nosso entendimento temos remansosa jurisprudência judicial afirmando que container (como também o software) não é mercadoria. Confira esta:

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: AGA - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - 472214
Processo: 200201157167 UF: RJ Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA
Data da decisão: 17/12/2002 Documento: STJ000475459

DJ DATA:10/03/2003 PÁGINA:133 - JOSÉ DELGADO

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. ADICIONAL DE TARIFA PORTUÁRIA (ATP). LEI Nº 7.700/88. DECRETO Nº 24.508/34. "CONTAINER" VAZIO. NÃO INCIDÊNCIA. SÚMULA Nº 50/STJ. PRECEDENTES.

1. Agravo Regimental contra decisão que negou provimento ao agravo de instrumento interposto pela parte agravante.

2. O Acórdão a quo concedeu a segurança para impedir a autoridade coatora de exigir o Adicional de Tarifa Portuária - ATP.

3. Estabelece a Súmula nº 50, desta Corte Superior: "o Adicional de Tarifa Portuária incide apenas nas operações realizadas com mercadorias importadas ou exportadas, objeto do comércio de navegação de longo curso".

4. "Container' não é mercadoria, cuja movimentação não faz incidir o ATP. " (REsp nº 250010/RJ, 1ª Turma, DJ de 25/06/2001, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS)

Embora no caso acima o acordo cuide de uma taxa, é ela tributo ligado a importação e isenta o container de sua cobrança apenas porque ele não é mercadoria. Pela mesma razão não pode haver fato gerador do imposto de importação e “hipso fato” não pode haver o regime suspensivo da admissão temporária, ainda que automática.

  • O QUE É O CONTAINER?

As normas jurídicas trazem várias conceituações, a saber: a lei 6.288/75 descarta a hipótese de embalagem:

Art. 3º O container, para todos os efeitos legais, não constitui embalagem das mercadorias, sendo considerado sempre um equipamento ou acessório do veículo transportador.

    Parágrafo único. A conceituação de container não abrange veículos, acessórios ou peças de veículos e embalagens, mas compreende seus acessórios e equipamentos específicos, tais como trailers, boogies, racks, ou prateleiras, berços ou módulos, desde que utilizados como parte integrante do container.

Art. 4º O container deve satisfazer as condições técnicas e de segurança previstas pelas convenções internacionais existentes, pelas normas legais ou regulamentares nacionais, inclusive controle fiscal, e atender as especificações estabelecidas por organismos especializados.

Vê-se, a Lei 6.288/75 retira as unidades de carga – container do conceito de “mercadoria” e lhes dá tratamento diferenciado a ser observado por toda e qualquer autoridade administrativa no território nacional, seja em zona primária aduaneira ou em zona secundária de fiscalização.

O Decreto 80.145/1977, em seu art. 4º. conceitua o seguinte:.

Art. 4º O container é um recipiente construído de material resistente, destinado a propiciar o transporte de mercadorias com segurança, inviolabilidade e rapidez, dotado de dispositivos de segurança aduaneira e devendo atender às condições técnicas e de segurança previstas pela legislação nacional e pelas convenções internacionais ratificadas pelo Brasil.

O judiciário pacificou a questão, decidindo que container não se confunde com a mercadoria que ele transporta:

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 908890
Processo: 200602677491 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA
Data da decisão: 10/04/2007 Documento: STJ000742754

DJ DATA:23/04/2007 PÁGINA:249

ADMINISTRATIVO. APREENSÃO DE CARGA ABANDONADA. RETENÇÃO DE CONTAINER. LEIS NºS 6.288/75 E 9.611/98.

1. Segundo o art. 24 da Lei nº 9.611/98, os containers constituem-se em equipamentos que permitem a reunião ou unitização de mercadorias a ser transportadas, não podendo ser confundidos com embalagem ou acessório da mercadoria transportada.

2. Inexiste amparo jurídico para a apreensão de containers, os quais, pela sua natureza, não se confundem com a própria mercadoria transportada.

3. Recurso especial improvido.

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 526767
Processo: 200300727870 UF: PR Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA
Data da decisão: 23/08/2005 Documento: STJ000638015

DJ DATA:19/09/2005 PÁGINA:186 - DENISE ARRUDA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. PERDIMENTO DE MERCADORIA. APREENSÃO DO CONTÊINER (UNIDADE DE CARGA). ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 24, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 9.611/98. NÃO-OCORRÊNCIA. INEXISTE RELAÇÃO DE ACESSORIEDADE ENTRE O CONTÊINER E A MERCADORIA NELE TRANSPORTADA. EXEGESE DO ART. 92 DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. A questão controvertida consiste em saber se o contêiner utilizado no transporte de carga é acessório da mercadoria nele transportada e, por conseqüência, deve sofrer a pena de perdimento aplicada à mercadoria apreendida por abandono.

2. O Tribunal a quo entendeu que o contêiner não se confunde com a mercadoria nele transportada, razão pela qual considerou ilícita sua apreensão em face da decretação da pena de perdimento da carga. A recorrente, em vista disso, pretende seja reconhecido o contêiner como acessório da carga transportada, aplicando-se-lhe a regra de que o acessório segue o principal.

3. "Principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessório, aquele cuja existência supõe a do principal” (CC/02, art. 92).

4. Definido, legalmente, como qualquer equipamento adequado à unitização de mercadorias a serem transportadas e não se constituindo embalagem da carga (Lei 9.611/98, art. 24 e parágrafo

único), o contêiner tem existência concreta, destinado a uma função que lhe é própria (transporte), não dependendo, para atingir essa finalidade, de outro bem juridicamente qualificado como principal.

5. Assim, a interpretação do art. 24 da Lei 9.611/98, à luz do disposto no art. 92 do Código Civil, não ampara o entendimento da recorrente no sentido de que a unidade de carga é acessório da mercadoria transportada, ou seja, que sua existência depende desta.

Inexiste, pois, relação de acessoriedade que legitime sua apreensão ou perdimento porque decretada a perda da carga.

6. Recurso especial conhecido e desprovido.

Qual seria essa “função própria”? Entendemos que a função própria do container é levar mercadoria de um lado para outro com segurança, tomando, em cada operação, a identidade de “equipamento do veículo que o transporta”. Portanto, é algo peculiar, que discrepa da normalidade. Deve receber tratamento diferenciado, a ponto de ter sua entra LIVRE no território nacional.

De fato, diz a norma abaixo transcrita que ele é “parte do todo”. Qual todo? Entendemos que “todo” aqui significa todo veículo que vai transportá-lo. Se está num navio é equipamento do navio. Descarregado em um caminhão passa a ser equipamento do caminhão. Transbordado para o trem passa a ser equipamento do trem. Sua função própria, peculiar, é a de tomar a feição de equipamento do veículo que o transporte. É também esta peculiaridade que lhe dá sustentação jurídica para que o legislador o considere de “LIVRE” entrada e circulação interna. Confira:

O ingresso no País de Unidade de Carga está disciplinado pela Lei n. 9.611/98, que nos arts. 24 a 26 dispõem:

“Art. 24 – Para os efeitos desta lei, considera-se unidade de carga qualquer equipamento adequado à unitização de mercadorias a serem transportadas. Sujeitas a movimentação de forma indivisível em todas as modalidades de transporte utilizadas no percurso.

§ único – A unidade de carga, seus acessórios e equipamentos não constituem embalagem e são partes integrantes do todo.

Art. 25 – A unidade de carga deve satisfazer aos requisitos técnicos e de segurança exigidos pelas convenções internacionais reconhecidas pelo Brasil e pelas normas legais e regulamentares nacionais.

Art. 26 – É livre a entrada e saída, no País, de unidade de carga e seus acessórios e equipamentos, de qualquer nacionalidade, bem como a sua utilização no transporte doméstico.

Quando a lei fala em “Sujeitas a movimentação de forma indivisível em todas as modalidades de transporte utilizadas no percurso” está confirmando nosso entendimento de que se trata de equipamento do veículo que o transporta, eis que embora vários sejam os modais (navio, caminhão, trem) este bem é indivisível, será sempre o mesmo: equipamento do todo (navio, caminhão, trem).

Portanto, a lei deu à unidade de carga a condição de obter livre entrada e circulação no transporte doméstico. Não marca prazo para saída. Pode ficar eternamente no país, no transporte doméstico, porque não é mercadoria e toma a feição jurídica de equipamento (seja nacional ou estrangeiro) que o está carregando.

Não há porque haver qualquer controle aduaneiro em sua tramitação, como estabelecem as normas infra-legais baixadas pela Receita Federal.

  • RESTA UMA QUESTÃO A SER RESOLVIDA

A análise que fizemos acima tem como base o container de propriedade de empresa estrangeira, que envia seu container para trazer mercadoria ao Brasil e, como a lei permite, utiliza-o internamente no “transporte doméstico”. Porém, se ela quiser vendê-lo para uma empresa nacional, deverá promover o despacho para consumo?

Entendemos que não, pois só pode haver despacho para consumo de “mercadoria” e container não é mercadoria. Se tem LIVRE ingresso no país – repetimos – não há que se falar em fato gerador do imposto de importação. Se não há fato gerador do imposto de importação não pode haver despacho para consumo.

Nossa conclusão: não deve ser exigido despacho para consumo do container, se nacionalizado pela compra e venda interna -- relembre a diferença entre nacionalização (compra e venda) e despacho para consumo (registro de DI -- mas apenas uma operação mercantil, segundo as leis comerciais, tendo como fato peculiar o pagamento ao exterior. Em casos semelahntes tem sido autorizada a emissão de licença de importação apenas para efeitos cambiais. Com ela o adquirente nacional remeteria o valor via Banco Central. O comprador nacional ficaria sujeito apenas aos tributos internos incidentes em operações como esta.

Com isto a Receita Federal ficaria livre de um grande “abacaxi”, que adquiriu com sua visão distorcida de pretender controlar cada um dos containeres ingressados no país, exigindo a prova de sua regular importação, quando essa importação é livre de qualquer prova.

Mas esta é uma questão que só o judiciário pode decidir.

Um comentário:

Unknown disse...

Prezado Rogerio;
trabalho na area de comercio exterior e tenho algumas duvidas a respeito de nacionalização de container algumas empresas aqui onde resido me pedem muito isso, mas confesso que tenho algumas duvidas gostaria de saber qual a veracidade disso se devemos fazer a nacionalização dos equipamentos para serem usados em transporte de carga domestica ou até mesmo com odepositos de armazenagem o que aqui na minha região e muito comum usar container até para moradia
Se vocẽ puder me retornar agradeço

Atte;

Darlan Dapper
47-84051418