Adriana De Luca
Mandado de segurança é uma ação prevista na Constituição Federal/1988, em seu artigo 5º, inciso LXIX, de natureza civil, qualquer que seja a natureza do ato impugnado (seja ele administrativo ou não).
Sua função é proteger fatos líquidos e certos contra atos ilegais ou praticados com abuso de poder por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica, no exercício de atribuição do Poder Público. Entende-se como autoridade todo agente público investido de poder de decisão para anular o ato atacado ou para suprir a omissão lesiva do impetrante.
Os processos de mandado de segurança têm prioridade de tramitação sobre todos os atos judiciais (com exceção do habeas corpus), podem ser impetrados (em caso de urgência) por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autenticidade comprovada e neles não há condenação ao pagamento de honorários à parte sucumbente (vencida).
Pois bem, o artigo 7º da Lei nº 12.016, de 07/08/09 (atual Lei de Mandado de Segurança), prevê que ao despachar a petição inicial o juiz ordenará, entre outras providências, “que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida...”.
Trata-se de concessão de liminar em mandado de segurança. Até o advento dessa lei, a concessão de liminares era usual em nossos Tribunais. Divergência de interpretação relacionada à classificação aduaneira – como, por exemplo, a interpretação de ser a mercadoria importada produto final ou não (já que os produtos finais sofrem uma maior incidência de IPI e I.I.); exigências indevidas de autoridades fiscais – como, por exemplo, a interpretação de não ser a importadora instituição assistencial sem fins lucrativos (fato que não afastaria a incidência de ICMS sobre a aquisição de mercadorias) ou a liberação em eventual greve dos servidores da Receita Federal eram algumas matérias objeto de apreciação para respectiva concessão.
A mais alta Corte de nosso país chegou, inclusive, a editar Súmula orientando ser “inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos” – Súmula nº 323 do STF.
No entanto, o parágrafo segundo do já citado artigo 7º da Lei nº 12.016/09 determina que “não será concedida medida liminar que tenha por objeto... a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior”.
Em princípio poderíamos concluir que tal dispositivo constitui importante restrição ao desenvolvimento do comércio exterior, mas sua leitura não deve ser realizada de maneira isolada.
Primeiramente, cumpre-nos advertir que tal vedação também estava presente na Lei nº 2.770/56 (antiga Lei de Mandado de Segurança) sem que, no entanto, consistisse óbice para a concessão de ditas liminares.
Certamente, não podemos negar que estamos diante de verdadeiro retrocesso legal já que a legislação sobre a matéria não acompanhou o tal conhecido “galope” das decisões de nossos Tribunais. Principalmente se considerarmos que tais decisões nada mais fizeram do que adequar as situações fáticas aos ditames constitucionais.
É importante frisarmos que a análise do referido dispositivo deve levar em conta o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, que determina que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Por meio desse comando supremo, concluímos, sem ressalvas, pela flagrante inconstitucionalidade da referida vedação já que o princípio da inafastabilidade da jurisdição não só garante o acesso à Justiça, mas sim, e mais importante, protege o acesso à ordem jurídica justa.
Dessa forma, o fator da lentidão do Judiciário aliado aos fatores: custos de armazenagem, aluguel do container, perecimento ou defasagem da mercadoria, entre outros, devem ser levados em consideração sob pena de estarmos infringindo garantia constitucional impassível de violação.
E é com tranquilidade que observamos surgirem decisões acompanhando as mesmas fundamentações aqui explanadas (8ª Vara Federal de Brasília e 2ª Vara Federal de Novo Hamburgo – Rio Grande do Sul).
Com isso, podemos concluir que a viabilidade de concessões de liminares contra apreensões de mercadorias não fraudulentas continua resguardada, malgrado os ditames de nossos legisladores.
Adriana De Luca
Advogada
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