Conjuntura: Importação de bens de capital da China aumentou dez vezes no período entre 2000 e 2008
Começa a fazer parte do passado a identificação da importação de produtos chineses com bens de consumo, como roupas, guardachuvas e cadeados. Desde o ano 2000, a entrada de itens como rolos compressores, escavadeiras, motoniveladoras, empilhadeiras e pás carregadeiras cresce exponencialmente. Há nove anos, as máquinas e equipamentos chineses significavam 0,85% do total comprados no exterior pelo Brasil, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). Em 2004, já atingiam 2,1%. Dois anos depois, a porcentagem chegou a 5,1%. Em 2008, bateu em 9,3%, proporcionalmente dez vezes mais do que o registrado oito anos antes.
A evolução é ainda mais impressionante quando se leva em conta que a importação brasileira de bens de capital como um todo multiplicou por apenas três vezes entre 2000 e 2008, passando de cerca de US$ 7 bilhões para US$ 22 bilhões. Em números absolutos, a fatia chinesa desse bolo passou de US$ 60 milhões há nove anos para US$ 2 bilhões no ano passado. Em 2009, porém, a participação chinesa sobre as importações de bens de capital diminuiu. Beneficiadas por um mercado interno aquecido, essas indústrias preferiram manter preços, perdendo participação no mercado brasileiro, que encolhe devido à crise. Diante desse cenário e da perspectiva de expansão das vendas no longo prazo, algumas indústrias começam a investir em estrutura própria no Brasil.
"Ganhamos mercado competindo em preço" comentou Zeng Guang´an, vice-presidente da Liu Gong, uma empresa chinesa instalada em Guang Xi, a maior produtora de pás carregadeiras na China, com 38 mil unidades por ano. No Brasil, onde instalou no mês passado um escritório em Belo Horizonte, a BH Máquinas, o executivo chinês disse que a importação começa a ganhar escala suficiente para que a Liu Gong pense em produzir localmente. A primeira remessa de pás carregadeiras da Liu Gong em 2007 foi de apenas 20 máquinas. No ano passado, já foram vendidas 140 unidades. Este ano, a Liu Gong prevê fechar com 450 itens vendidos no Brasil. Somente no primeiro quadrimestre foram comercializadas 150 máquinas. "Com mil vendas por ano, já podemos instalar uma unidade fabril, para atender ao Brasil e aos países vizinhos", disse o presidente da Liu Gong para a América Latina, o americano Jim Donaghue.
Em 2008, a Liu Gong montou uma fábrica na Índia, mercado onde conseguiu vender 500 unidades. "Decidimos produzir localmente ali em razão do protecionismo indiano. Mas no Brasil os competidores locais são muito mais fortes do que lá e precisamos ganhar maior escala para pensar em produzir no país e permanecermos competitivos em preço", disse Zeng. A Liu Gong é uma empresa controlada pelo governo chinês, mas com 60% de seu capital negociado em bolsa. Faturou US$ 1,6 bilhão no ano passado e projeta este ano um crescimento de 10%, mesmo com a crise econômica global. "O mercado chinês garante nosso crescimento, porque atendemos diretamente aos investimentos governamentais em infraestrutura."
O crescimento da Liu Gong no país em 2009 vai contra a tendência da importação de bens de capital chineses este ano. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento da Indústria e do Comércio, houve um desaquecimento das encomendas em 2009. As importações de bens de capital chineses entre janeiro e maio atingiram 160 mil toneladas de aço entre janeiro e maio, consumindo US$ 1, 6 bilhão. No mesmo período em 2008 foram trazidas 200 mil toneladas por US$ 2,6 bilhões.
De acordo como o diretor da área de comércio da Abimaq, Nelson Delduque Costa Júnior, salvo na área de óleo e gás, é difícil conceber a vinda das linhas de produção de exportadores como a Liu Gong. "A China tem uma estrutura de custos inigualável, ao poder estabelecer a taxa de câmbio que considera mais conveniente para a exportação e lidar com uma mão de obra muito barata. Eles desenvolvem uma concorrência voltada unicamente para o barateamento do produto final, vendendo às vezes a mercadoria a preço de custo. São condições que se consegue produzindo lá, e não aqui."
Outra empresa chinesa a instalar rede de vendas no Brasil é a Shandong Lingong Construction Machinery (SDLG), fundada pelo governo em 1972 e privatizada nos anos 90. A empresa tem como principal sócio a Volvo Construction Equipment (Volvo CE) e está entre as quatro maiores produtoras de carregadeiras da China. No início do mês, a SDLG anunciou investimento de US$ 7 milhões no Brasil (US$ 10 milhões em toda América Latina) na instalação de uma rede de vendas da marca. No Brasil, serão instalados 36 pontos de vendas e na América Latina, 67 pontos de venda. Além do Brasil, já foram implantadas unidades na Argentina, no Uruguai e no Chile.
"O mercado potencial de vendas de carregadeiras é de 5.800 unidades no Brasil e 9 mil unidades na América Latina por ano", observa o diretor de negócios da SDLG Latin America, Afrânio Chueire. O volume de vendas, disse, não é suficiente para exigir a instalação de fábrica no país. A empresa antes vendia máquinas para construção a importadores brasileiros. Em 2007, foram enviadas 85 unidades ao Brasil; em 2008, o volume subiu para 127 unidades. A expectativa é atingir 230 unidades neste ano e 422 em 2010. "A meta é alcançar 10% de participação do mercado da América Latina, ou 650 unidades já no próximo ano", afirmou Chueire. O cenário de crise, diz, não afetou os planos para o Brasil. "O mercado está menor do que no ano passado, mas isso não afetou os planos de longo prazo."
O agravamento da crise internacional levou as indústrias brasileiras a adiar investimentos. Como resultado, as importações sofreram forte desaceleração. De janeiro a abril, o crescimento foi de 3,6%, muito inferior aos 48,5% acumulados de janeiro a agosto de 2008, mês de pico das importações. As compras da China, no quadrimestre, recuaram 12,8% e o país perdeu participação nas importações brasileiras, para 8,4%, ante 9,7% em igual intervalo de 2008.
"A crise não afetou os investimentos na China como afetou aqui. O mercado interno de máquinas chinês continua aquecido e, por isso, as empresas exportadoras estão menos dispostas a baixar preços para manter o ritmo de vendas, diferentemente do que vêm fazendo exportadores de outros países", observa o presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Máquinas e Equipamentos Industriais (Abimei), Thomas Lee. A dificuldade em renegociar preços também é apontada como uma das causas para a instalação de redes de distribuição direta pelas empresas chinesas.
Duas das maiores importadoras de máquinas e equipamentos corroboram essa teoria. O diretor presidente do Grupo Megga, Stefan Lee, afirma que os produtos chineses perderam competitividade durante a crise em termos de preço.
"Tenho fornecedores que estão me dando descontos sem eu pedir, só para manter o nível de produção e reduzir o seu custo fixo. As empresas chinesas não precisam dar descontos porque estão com o mercado interno aquecido", afirma. Stefan Lee não informa o nível de queda nas vendas de máquinas-ferramentas, mas considera que a empresa levará de três a cinco anos para retomar o nível de vendas obtido em 2008. "Haverá uma recuperação gradual, mas é um processo lento", diz. Segundo ele, as vendas de ferramentaria para produção de moldes para a indústria automotiva e sopros de plástico (para indústrias de alimentos) já retomaram as encomendas. "Acredito que outros setores voltarão a investir em máquinas e ferramentas a partir do segundo semestre."
O Grupo Bener, importador de máquinas-ferramentas, relatou queda de 50% nas importações no primeiro semestre, em comparação com o mesmo período de 2008. O diretor-comercial, Paulo Lerner, afirma que a maioria das empresas brasileiras parou de comprar máquinas-ferramentas em função da crise externa - a China é um dos principais países fornecedores desse segmento - o que causou elevação dos estoques. "O grupo chegou a importar 40 contêineres por mês em 2008. Hoje, se chegar a quatro por mês é muito", afirma. Bener diz ter reduzido drasticamente as importações nos meses anteriores, sobretudo da China. Agora, com a melhora do cenário macroeconômico brasileiro, ele vê retomada das encomendas das indústrias, e prevê a retomada gradativa das importações, podendo chegar a dez contêineres por mês até o fim do ano.
(aspas)
Fonte : Jornal “Valor Econômico” edição de 24/06/2009
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