Pesquisa da Fiesp com 1.211 empresas mostra como a deficiência de estradas, portos e ferrovias reduz a competitividade da indústria
SÃO PAULO - Da China até o Brasil, um contêiner percorre cerca de 17 mil quilômetros (km) numa viagem que pode durar 35 dias de navio. O transporte de cada unidade até o Porto de Santos fica em torno de US$ 1,2 mil (R$ 2 mil), dependendo do tamanho da embarcação e das negociações com os armadores. Dali até a capital paulista são apenas 77 km, quase nada diante da viagem feita desde o Oriente. Mas o custo - pasmem - é o mesmo.
A movimentação de carga entre Santos e São Paulo custa cerca de R$ 2 mil por contêiner, conta Fernando Nicory, diretor da Magma, empresa do setor têxtil que compra parte de sua matéria-prima no exterior. "A mercadoria cruza o mundo por US$ 1,2 mil e sobe a serra por R$ 2 mil. Isso tira a competitividade e diminui nosso espaço no mercado internacional", lamenta Nicory.
Como o executivo, outras indústrias sofrem do mesmo mal. A infraestrutura precária tem provocado uma expansão sem limites nos custos logísticos, que corroem a rentabilidade das companhias. Segundo um estudo do Departamento de Competitividade de Tecnologia (Decomtec) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), as empresas têm uma despesa anual extra de R$ 17 bilhões por causa das péssimas condições das estradas, burocracia (e sucateamento) nos portos, falta de capacidade das ferrovias e gastos com armazenagem.
Tudo isso aliado à exorbitante carga tributária do País cria um ambiente inóspito à expansão dos negócios. "Está muito caro produzir no Brasil", lamenta o diretor do Decomtec, José Ricardo Roriz, responsável pelo estudo Carga Extra na Indústria Brasileira, feito a partir de uma pesquisa com 1.211 empresas do setor. Segundo elas, 0,36% (R$ 6,2 bilhões) do faturamento anual é gasto com manutenção da frota de veículos; 0,6% (R$ 10,2 bilhões) vai para o transporte das mercadorias; e 0,4% (R$ 675 milhões) fica com armazenagem obrigatória devido aos atrasos.
Esses custos extras representam quase 15% de todo gasto que a indústria tem com transportes e armazenagem. No total, as companhias destinam 7,2% do faturamento, ou R$ 122,3 bilhões, para movimentar suas mercadorias no Brasil.
Explosiva. Na avaliação de Roriz, o País vive uma situação explosiva: "A taxa de juros é elevada, o câmbio está desvalorizado, o preço da energia e da logística está nas alturas e a carga tributária não para de crescer". Segundo o estudo, em vários países o peso dos impostos é elevado, mas o governo consegue devolver o dinheiro por meio de uma infraestrutura de qualidade, o que reduz o custo de transporte.
Aqui a situação é completamente oposta. Além de pagar fortunas de tributos, as empresas ainda são punidas com os custos decorrentes das péssimas condições de estradas e portos. "A gente faz malabarismo para cumprir todos os cronogramas e entregar as encomendas em dia", conta Nicory, da Magma. Segundo ele, nos últimos anos a escalada dos custos obrigaram a empresa a criar um departamento logístico para traçar novas rotas de transporte e reduzir a pressão sobre a rentabilidade.
A estratégia da empresa, que tem quatro fábricas em São Paulo, já surtiu efeito positivo: reduziu em 50% os custos que representavam até 5% do faturamento. "Nossas vendas são muito pulverizadas. Temos clientes em todas as regiões do País e precisamos entregar pedidos com agilidade." A empresa tem frota própria para enfrentar os problemas urbanos, especialmente os da capital paulista, onde tem uma unidade. "Tiramos as mercadorias da fábrica no Brás em pequenos caminhões e levamos até transportadoras instaladas próximas de Guarulhos. Dali elas fazem a distribuição."
O caminho até o cliente, no entanto, é cheio de contratempos. "Ora chove e os caminhões não conseguem sair do lugar; ora os veículos quebram por causa da quantidade de buracos e não chegam ao destino dentro do prazo estabelecido. Quantas vezes, os navios deixam os portos brasileiros sem a mercadoria prevista. Os prejuízos são incomensuráveis", destaca Alfried Plöger, do Grupo Melhoramentos, cujos negócios englobam editora, celulose e desenvolvimento urbano.
Segundo ele, da porta da fábrica para dentro, boa parte das empresas brasileiras não perde para nenhuma outra em termos de custos. Mas, ao atravessar os portões, o produto nacional perde competitividade e, muitas vezes, não consegue disputar nem no mercado interno. Uma das críticas de Plöger, cuja empresa importa e exporta produtos, está na burocracia do sistema portuário brasileiro. Ele conta que, na última Bienal, os livros que seriam lançados não chegaram a tempo do evento porque houve demora na liberação.
As transportadoras também reclamam dos portos. A queixa do presidente da ASA Transportes, Valdir Santos, é o tempo para descarregar em Santos. "Às vezes, demora dois dias. Isso significa ficar com o caminhão parado, sem receber nada."
(aspas)
Por : Renée Pereira, Jornal "O Estado de S.Paulo" 19 de fevereiro de 2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário