segunda-feira, 5 de abril de 2010

Banco Central faz faxina nas regras do câmbio

O Banco Central (BC) deu mais um passo para simplificar e desburocratizar as regras cambiais. Desta vez foram beneficiadas as operações de investimentos diretos, créditos externos, royalties, transferências de tecnologia e arrendamento mercantil externo, além das emissões de ações no exterior.

Com a edição de duas resoluções (n º 3.844 e 3.845) e três circulares (nº 3.491, 3.492 e 3.493), o BC consolidou e organizou disposições que constavam de 60 normativos. A racionalização de regras foi além disso. Foram finalmente revogadas nada menos que 320 medidas que estavam em desuso, desatualizadas ou simplesmente não eram mais aplicáveis, mas ainda constavam da legislação.

Chamou mais atenção a permissão de manter no exterior por prazo indeterminado os recursos captados com a emissão de ações. Anteriormente, o dinheiro obtido tinha que ser trazido para o país em até cinco dias. A nova regra não vale para instituições financeiras. Outra nova medida destacada é a ampliação de 360 dias para 750 dias do prazo dado ao Tesouro Nacional para comprar dólares no mercado interno para quitar dívidas externas vincendas.

Mas a faxina pretendeu também reduzir a burocracia nas transferências financeiras do exterior e para o exterior, em moeda nacional ou estrangeira, de determinados fluxos de capital, que ficaram dispensados de autorizações específicas ou manifestações prévias do Banco Central, bastando haver documentação que comprove a legalidade e a fundamentação econômica da operação.

Especulou-se que o objetivo do Banco Central seria induzir a valorização do dólar uma vez que menos divisas estrangeiras podem ingressar no país com a possibilidade de os emissores de ações deixarem recursos no exterior. Além disso, mais divisas podem sair com a ampliação da margem de manobra do Tesouro no resgate de seus papéis no exterior.

Essa hipótese não se sustenta, porém, uma vez que os emissores de ações e o Tesouro vão usar a flexibilidade recém-obtida quando for vantajoso, o que não é o caso agora, basicamente por causa dos juros internos elevados. O custo do dinheiro é mais barato no exterior e só interessa ao Tesouro resgatar papéis com antecedência caso pretenda eventualmente mudar o perfil da sua dívida externa.

Também não é vantajoso para a empresa que emitiu ações deixar os recursos no exterior a não ser que a captação tenha como objetivo fazer uma aquisição no mercado internacional.

Desde 2008, as empresas podem deixar no exterior 100% da receita obtida com exportações. Embora não existam dados oficiais a respeito, sabe-se que essa possibilidade é pouco utilizada uma vez que os recursos têm retorno melhor no mercado brasileiro.

Assim, o principal objetivo das novas medidas do Banco Central é, de fato, arejar as regras do mercado de câmbio, simplificar e baratear as operações. Seguidas crises cambiais levaram o Brasil a montar um arcabouço jurídico bastante controlador e burocrático, desde 1933, quando Getúlio Vargas obrigou os exportadores a trazerem para o país toda a receita obtida com as vendas externas.

A adoção do câmbio flutuante, em 1998, abriu espaço para o afrouxamento das regras, o que só foi realmente possível quando o mercado passou a operar com taxas livres e o país mostrou-se mais resistente às crises cambiais. A primeira grande mudança ocorreu em 2005, com a unificação das cotações do câmbio e a abolição de alguns limites para compra e venda de moeda estrangeira e transferência de recursos para o exterior. No ano seguinte, os exportadores foram autorizados a deixar fora do país 30% das receitas das vendas externas, percentual ampliado para 100% em 2008, ano em que houve nova onda de flexibilização. A compra de pequenas quantias de moeda estrangeira foi facilitada e o BC foi autorizado a ter depósitos em reais no exterior, passo importante para a internacionalização da moeda brasileira.

Daí até a livre conversibilidade do real há um enorme caminho. Sonho de alguns economistas e de expoentes do mercado que querem tornar o país uma praça financeira internacional – o acalentado projeto Omega -, a livre conversibilidade deve ser profundamente repensada à luz da crise internacional. A crise mostrou os perigos do livre fluxo de capitais pelo mundo, questionado agora até por economistas do Fundo Monetário Internacional.

(aspas)

Fonte : Jornal “Valor Econômico”, 31/03/2010

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