terça-feira, 18 de novembro de 2008

ILEGALIDADES DA IN 206/02 – APREENSÃO E PERDIMENTO POR ERROS DE CLASSIFICAÇÃO, SUBFATURAMENTO OU ENDOSSO NO CONHECIMENTO DE TRANSPORTE

Estou lendo o livro "Importação e Exportação no Direito Brasileiro", da RT (que recomendo mais uma vez que comprem!!) e me deparei com um trecho que fala sobre a malfadada IN 206/2006, a campeã motivadora das retenções.

O esplêndido livro demonstra facilmente a ilegalidade das retenções com base na IN 206, com o seguinte raciocínio:

1. O parágrafo único do art. 68 da Medida Provisória 2.158-35, de 24/08/2001 conferiu a Receita Federal o poder de regulamentação do prazo de retenção das mercadorias sujeitas à pena de perdimento e as situações em que as mercadorias podem ser entregues ao importador antes da conclusão do procedimento fiscalizatório. Vejamos:

Art. 68. Quando houver indícios de infração punível com a pena de perdimento, a mercadoria importada será retida pela Secretariada Receita Federal, até que seja concluído o correspondente procedimento de fiscalização.

Parágrafo único. O disposto neste artigo aplicar-se-á na forma a ser disciplinada pela Secretaria da Receita Federal, que disporá sobre o prazo máximo de retenção, bem assim as situações em que as mercadorias poderão ser entregues ao importador, antes da conclusão do procedimento de fiscalização, mediante a adoção das necessárias medidas de cautela fiscal.


2. A regulamentação foi feita através da IN 206/02, em seu art. 69, que determinou o prazo máximo de 90 dias, com prorrogação por mais 90 dias.

3. Já o art. 66 da mesma IN, exacerbando a outorga legal da medida provisória, estabeleceu situações de aplicação da pena de perdimento não previstas em lei e ignorando o Regulamento Aduaneiro, dentre as situações inventadas a de declaração falsa quanto à classificação fiscais de bens e declaração falsa quanto ao preço (essa sim uma aberração inventada pela RF que nunca prova que o preço esta subfaturado, valendo-se sempre de um sistema chamado LINCE para provar preço, como se isso provasse alguma coisa).

4. A IN 206 diz que esta sujeito ao procedimento especial somente a irregularidade punível com perdimento. Subfaturamento e classificação fiscal errônea não são puníveis com perdimento. Vejamos o que diz a IN:

Procedimentos especiais de controle aduaneiro

Art. 65. A mercadoria introduzida no País sob fundada suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento ou que impeça seu consumo ou comercialização no País, será submetida aos procedimentos especiais de controle aduaneiro estabelecidos neste título.


5. É sabido que classificação fiscal equivocada pode ser retificada no próprio despacho, porque se o importador depender de solução de consulta formal esperará mais de 4 anos por uma decisão e também porque é extremamente difícil classificar um bem, já que a NESH é maior do que um catálogo telefônico.

6. Quanto ao subfaturamento ou superfaturamento estes estão previstos em lei com a penalização apenas por MULTA, cf. reza o art. 633, I, do Regulamento Aduaneiro. Vejamos:

Art. 633. Aplicam-se, na ocorrência das hipóteses abaixo tipificadas, por constituírem infrações administrativas ao controle das importações, as seguintes multas (Decreto-lei nº 37, de 1966, art. 169 e § 6º, com a redação dada pela Lei nº 6.562, de 18 de setembro de 1978, art. 2º):

I - de cem por cento sobre a diferença entre o preço declarado e o preço efetivamente praticado na importação ou entre o preço declarado e o preço arbitrado (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 88, parágrafo único);

7. A multa é o máximo de penalidade que se pode aplicar.

8. Onde está na medida provisória a previsão do perdimento para subfaturamento ou classificação fiscal equivocada???

9. Ao arrepio da lei a IN 206 inventou as situações puníveis, agindo a RF como se legislador fosse, inserindo no art. 66 da IN as situações:

Art. 66. As situações de irregularidade mencionadas no artigo anterior compreendem, entre outras hipóteses, os casos de suspeita quanto:

I - à falsidade na declaração da classificação fiscal, do preço efetivamente pago ou a pagar ou da origem da mercadoria, bem assim de qualquer documento comprobatório apresentado;

II - ao cometimento de infração à legislação de propriedade industrial ou de defesa do consumidor que impeça a entrega da mercadoria para consumo ou comercialização no País;

III - ao atendimento a norma técnica a que a mercadoria esteja submetida para sua comercialização ou consumo no País;

IV - a tratar-se de importação proibida, atentatória à moral, aos bons costumes e à saúde ou ordem públicas;

V - à ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiro; ou

VI - à existência de fato do estabelecimento importador ou de qualquer pessoa envolvida na transação comercial.

§ 1º As suspeitas da fiscalização aduaneira quanto ao preço efetivamente pago ou a pagar devem estar baseadas em elementos objetivos e, entre outras hipóteses, na diferença significativa entre o preço declarado e:

I - os valores usualmente praticados em importações de mercadorias idênticas ou similares;

II - os valores indicados em cotações de preços internacionais, publicações especializadas, faturas comerciais pro forma, ofertas de venda etc.;

III - os custos de produção da mercadoria;

IV - os valores de revenda no mercado interno, deduzidos os impostos e contribuições, as despesas administrativas e a margem de lucro usual para o ramo ou setor da atividade econômica.

10. Ainda, aquela história de que transferir a terceiros mercadoria importada é proibido é balela, e não encontra respaldo legal para motivar apreensão.

11. Porque não posso endossar um conhecimento de transporte se o próprio código comercial assim permite?

12. O conhecimento pode ser transferido por endosso:

* em preto, quando consta a indicação do nome do endossatário (favorecido com o endosso)

* em branco, quando não consta o nome do endossatário, passando o conhecimento a ser considerado ao portador.

13. O Novo Regulamento trouxe uma novidade no capítulo do conhecimento de carga que é muito útil para os importadores, para que a RF não proíba por simples Ordem de Serviço operações consagradas pelo Direito Comercial como o endosso no conhecimento de carga.

14. Assim dispõe o art. 496 do Novo Regulamento:

“Art. 496 - Os requisitos formais e intrínsecos, a transmissibilidade e outros aspectos atinentes aos conhecimentos de carga devem regular-se pelos dispositivos da legislação comercial e civil, sem prejuízo da aplicação das normas tributárias quanto aos respectivos efeitos fiscais.”

15. Quanto à apreensão por subfaturamento, a RF simplesmente ignorou os ditames do art. 31 da IN 327/03 que ela mesma aditou, que diz que o procedimento para verificação da valoração deve ser feito pela unidade da RF do contribuinte em sede de revisão aduaneira e não pelo Fiscal do despacho. Vejamos:

Instrução Normativa SRF 327/03

(...)

Art. 31. Os procedimentos fiscais para verificação da conformidade do valor aduaneiro declarado às regras e disposições estabelecidas na legislação serão realizados após o despacho aduaneiro de importação, sob a responsabilidade da unidade da SRF com jurisdição sobre o domicílio fiscal do importador e que possua atribuição regimental para executar a fiscalização aduaneira.

(...)

16. Em síntese, é patente a afronta à Medida Provisória 2.158-35 de 2001 pela IN 206/02, cabendo facilmente discussão na esfera judicial para liberação dos bens.

ROGERIO Z. CHEBABI

Um comentário:

Anônimo disse...

Esclarecedores.
reitero a importancia de estarmos atentos ao que se baseia a legislacao para podermos nos amparar e trabalhar corrtamente, tanto fiscais, quanto importadores