Portos em Estados que concedem benefícios têm aumento na entrada de produtos acima da média nacional, diz estudo
Mudança de rota das importações também pode ser motivada por custo maior no Rio e em Santos, diz economista
Cresce a prática da concessão por Estados brasileiros de benefícios fiscais para importações. Com isso, a guerra fiscal ganha mais um round e poderá parar na Justiça.
Estudo feito pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) mostra que alguns portos localizados em Estados que oferecem benefício fiscal para importações registraram aumento delas em dólares até mais de 20 pontos percentuais acima do da média brasileira de 2005 a 2009.
Em volume, a diferença chegou a quase 40 pontos no caso mais extremo.
Os benefícios ganham a forma de parcelamento ou de desconto no pagamento da alíquota do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
Para a entidade, esses incentivos representam concorrência desleal com os demais Estados e prejudicam a indústria nacional.
"Além de ter a competitividade afetada pelo câmbio valorizado, a indústria vem sofrendo essa concorrência desleal dos importados", afirmou Roberto Giannetti da Fonseca, diretor da Fiesp.
Segundo Fonseca, os departamentos jurídicos da Fiesp e de entidades representativas da indústria nacional estão analisando a legalidade desses incentivos e poderão contestá-los judicialmente: "Acho que boa parte desses incentivos tem base inconstitucional".
Fonseca afirma que a concessão de benefícios fiscais para importações tem se disseminado. A Fiesp tem registro de seis Estados que lançam mão dessa prática atualmente: Paraná, Santa Catarina, Espírito Santo, Pernambuco, Goiás e Alagoas.
Mas acredita que o número pode chegar a nove."Há alguns anos, eram um ou dois", diz Fonseca.
MAIORES AUMENTOS
O levantamento mostra que as maiores altas de importação acima da média nacional ocorreram nos portos de Suape (Pernambuco), São Francisco do Sul (Santa Catarina) e Itajaí (Santa Catarina).
Esses três portos registraram aumento médio anual de suas importações em dólares de, respectivamente, 40%, 36% e 30%, ante 15% no Brasil como um todo, entre 2005 e 2009.
Em termos de volume, as diferenças foram mais marcantes: enquanto Suape, Itajaí e São Francisco do Sul tiveram aumento de suas importações de, respectivamente, 40%, 28% e 18%, a média brasileira anual cresceu 3% de 2005 a 2009.
Estados como Paraná e Santa Catarina também tiveram, de acordo com a Fiesp, um boom no número de novas empresas que importam acima de US$ 1 milhão, com aumentos expressivos de, respectivamente, 92% e 81% entre 2005 e 2009, ante um crescimento de 51% no Brasil como um todo.
Nessa comparação, Pernambuco ficou abaixo da média nacional, com 44%.
Para Isaias Coelho, professor de economia da FGV, a concessão de incentivos fiscais para importações realmente prejudica a competitividade da indústria nacional.
Mas ele ressalta que outros fatores podem também contribuir para o crescimento expressivo das importações em determinados portos:
"Portos como o de Santos e o do Rio de Janeiro são mais maduros e estão no limite de sua capacidade. O custo de importar via esses portos é, portanto, mais alto".
Portos têm "surto" de importados
Levantamento feito pela Fiesp mostra que alguns portos têm exibido o que a entidade chama de "surtos" de importação de determinados produtos.
Não há registro de importação de laminados de aço inoxidável a frio pelo porto de Itajaí (SC) em 2007, por exemplo. Já no fim do primeiro semestre deste ano, compras desse produto no exterior via Itajaí somaram o equivalente a 17,7% do total importado pelo país.
Segundo a Fiesp, exemplos como esse comprovam o efeito dos incentivos fiscais sobre importações nesses portos porque foi em 2007 que Santa Catarina passou a oferecer incentivos tributários para compras no exterior.
O consultor Clóvis Panzarini, especializado na área tributária, concorda que os incentivos tributários têm produzido efeito distorcivo sobre as importações.
"Mesmo com congestionamento em Santos, não faz muito sentido econômico importar derivado de aço que será usado principalmente em São Paulo via Santa Catarina."
Segundo Panzarini, a prática também lesa os Estados que não oferecem incentivos, mas que muitas vezes são o destino dos bens importados via portos que contam com benefícios.
Existem duas alíquotas de ICMS: a incidente dentro do Estado e a chamada interestadual (cobrada quando um item cruza a fronteira).
O Estado "incentivador" cobra do importador uma alíquota interna de ICMS reduzida. Ainda assim sai ganhando porque passa a ter uma arrecadação nova.
O problema é que o importado é normalmente destinado a outro Estado. Este (por conta do regime de compensação tributária) é obrigado a dar um crédito ao comprador final no valor da alíquota interestadual de ICMS vigente no mesmo.
Ou seja, ainda que o importador tenha pagado, por exemplo, 3% de ICMS em Santa Catarina, se o comprador final está em São Paulo, acaba com um crédito de 12% do valor do item que pode ser usado para pagar outros impostos.
(aspas)
Por : Érica Fraga e Camila Fusco, de São Paulo, para o Jornal "Folha de S. Paulo", 03/10/2010
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