segunda-feira, 5 de março de 2012

Trazer eletrônico do exterior compensa até com taxa e multa

Mesmo no pior cenário, custo é menor do que preço no Brasil

Trazer um equipamento eletrônico do exterior chega a sair mais barato do que comprá-lo no Brasil, mesmo no pior cenário, como o de um turista taxado e multado pela Receita Federal por não declarar o produto na alfândega do aeroporto.

Um Macbook Air 13 polegadas, da Apple, sai entre R$ 3.414 e R$ 4.139 no Brasil, segundo pesquisa em um site de comparação de preços.

Se decidir adquiri-lo em Nova York, por exemplo, o consumidor paga R$ 3.484, no máximo. Isso na hipótese que lhe é mais desfavorável: não declarar o produto à Receita e ser flagrado pelos fiscais da alfândega ao exceder a cota de US$ 500 permitida.

Nesse caso, há imposto de 50% sobre o excedente à cota e multa de até 50%.

Uma vez que o passageiro retido pague a multa em até 30 dias, se beneficia de um desconto tributário: a autuação cai pela metade. O Macbook, então, sairia por R$ 3.018 -11% menos que no Brasil.

O passageiro que declarar o produto à Receita é o que leva a maior vantagem: o notebook, com o imposto incluído, teria valor total de R$ 2.826, 17% inferior ao menor preço constatado pela Folha.

O mesmo ocorre se alguém trouxer dois iPads na mala.

TRIBUTAÇÃO

"Mesmo o cidadão pagando todos os tributos, sai mais barato trazer de fora. É a prova de que a carga tributária não está cabendo no bolso do contribuinte", diz o advogado tributarista Miguel Silva.

O imposto que as lojas têm de pagar para importar produtos e vendê-los no Brasil mata a competitividade, diz.

Procurada, a Receita em Brasília não respondeu à Folha. Em São Paulo, a informação foi que só seria possível responder hoje.

(aspas)

Por : Ricardo Gallo, de São Paulo

(aspas)

Cumbica : Apreensão de bagagens cresceu 200%

A quantidade de passageiros retidos pela Receita no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, aumentou 200% entre janeiro de 2009 e janeiro de 2012, mostrou a Folha ontem. Esses passageiros tiveram a bagagem apreendida por não declarar à alfândega produtos comprados no exterior acima da cota permitida.

ANÁLISE

Só um a cada sete passageiros passa pela fiscalização em Cumbica

Se apenas uma a cada sete pessoas é fiscalizada no aeroporto internacional de Cumbica (Guarulhos) e, dentre essas, apenas uma em 25 é punida, isso significa que nem sequer dois passageiros em cada Airbus A-330 que liga São Paulo a Miami são pegos pela Receita Federal.

É difícil crer que todos os outros 333 passageiros a bordo respeitaram suas cotas.

A matemática é simples: o crime passa a compensar quando a probabilidade de punição vezes o tamanho da punição é menor do que o potencial ganho com a atividade criminosa.

Se a probabilidade de ser punido é de meros 0,57%, e mesmo assim ainda se pode, em alguns casos, pagar a multa e tributos devidos sem perder o produto, o ganho com o descaminho é certo: 174 passageiros passam incólumes para cada um que é punido no aeroporto.

COMBATE

E vale a pena o combate aos sacoleiros?

O número de apreensões aumentou em 123% no último ano. Mas o número de fiscais no aeroporto saltou em 30% e hoje o contingente está por volta de 80.

Com salários acima de R$ 13 mil, a arrecadação das 94 apreensões em um total de mais de 16 mil desembarques diários provavelmente ainda não justifica o custo gerado ao erário.

Há quatro soluções: aumentar a eficiência da Receita mas sem aumentar o custo de fiscalização; aumentar a punição pelo descaminho; baratear os produtos locais a ponto de, contabilizado o custo da viagem, zerar o lucro dos sacoleiros; ou, finalmente, estabelecer cotas racionais que façam sentido em um país com a economia em franco crescimento.

(aspas)

Por :  Gustavo Romano, mestre em direito por Harvard e em ciências políticas pela UFMG. Produz o site direito.folha.com.br

Jornal "Folha de São Paulo" 01/03/2012

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